Até o fim!

Por

Enildo Luiz Gouveia*

Em 05.04.2023

Começo este artigo com esta frase que durante os vinte e cinco dias em que minha Mãe, Maria José Gouveia, também conhecida como Baixinha, Lilô, Dona Maria e simplesmente Gouveia, repeti exaustivamente ao ouvido dela – “até o fim” – mesmo estando ela intubada e sedada já há 20 dias.

Minha Mãe, como todas as pessoas, tinha alguns medos e, entre eles, o de envelhecer e ser abandonada em algum asilo/abrigo como muitos idosos ainda hoje vivem. Nos últimos 20 e poucos anos, algo que pedi a Deus foi que o mesmo me desse força e discernimento para nunca permitir isso. Além disso, dar a ela um pouco de conforto durante sua fase idosa. Imaginem: depois de uma vida de pobreza, de ser abandonada pelo esposo (meu pai) com dois filhos para criar, de muito trabalho pesado, várias cirurgias por doença… ter que padecer nos últimos dias.

Ela partiu e, como canta Nando Reis, “desde o dia em que perdi minha Mãe, eu me perdi de mim também. Perdi no mundo o que era o mundo meu – minha mãe”. Aprendi com ela que a vida só tem sentido se tivermos a preocupação com o outro. E também a valorizar a educação. Não era perfeita, pois perfeição humana não existe. Mas, era minha Mãe, uma guerreira, a melhor que já conheci. Aquela que mesmo eu já adulto, se preocupava, apresentava-me para outras pessoas como “meu menino”. Alegrou-se com minha aprovação e defesa no mestrado e doutorado, mesmo sem entender bem do que se tratava. Lembro-me que na adolescência chegou a pedir contribuição financeira no trabalho para comprar livros para que eu pudesse estudar.

Durante os dias de internamento, pedia a sua bênção todos os dias, como sempre fiz. Falava que estaria sempre ao lado dela e que jamais a abandonaria. Dizia isso na esperança de que ela ouvisse e ficasse mais calma para continuar lutando pela vida. Rezei, abençoei, chorei baixinho segurando a sua mão pra que ela não ouvisse e ficasse nervosa. O desgaste físico, psicológico e financeiro foi grande, mas suportável diante do desejo de que ela se recuperasse. Faria tudo de novo e ainda melhor se eu pudesse.

Até o fim! Segurei o caixão onde seu corpo estava. Segui até a sepultura para o último adeus. Agradeço a Deus pela Mãe que me foi dada. Agradeço as orações e a vibrações positivas que foram feitas por várias pessoas dos mais diversos credos. Por mais que saibamos que a morte é a verdade inevitável, a dor sempre é grande quando perdemos um ente querido. Há os que dizem que somos egoístas, mas se o próprio Jesus chorou pela morte do amigo Lázaro, quem somos nós para não sucumbir a tamanha dor?

Minha Mãe era uma Maria. E como católico que sou sempre vi nela a ternura da Virgem Maria que esteve ao seu lado no leito da UTI, intercedendo a Jesus, junto comigo, até o fim!

*Enildo Luiz Gouveia – Professor, poeta, teólogo, cantor e compositor. Integrante da Academia Cabense de Letras – ACL.