Uma amizade sólida

Por

Erivaldo Alves*

Em 14.07.2020   

(Em homenagem a Antônia, esposa durante esses 38 anos completados no último dia 10.07).

É melhor serem dois do que um.

   Salomão

Sem amigos, ninguém gostaria de viver, mesmo que possuísse todas as coisas boas da vida.

Aristóteles

Em razão de nossa condição financeira, acadêmica, religiosa, política, findamos por escolher pessoas iguais ou muito semelhantes para estabelecermos amizade mesmo que seja sintética e pouco significativa por medo que as pessoas nos conheçam como realmente somos. Por mais incrível que possa parecer, temos a tendência de gastar tempo demais para ganhar dinheiro, realizar tarefas do dia a dia e ter sucesso na profissão, mas não dedicamos nosso bem mais precioso – o tempo – ao objetivo para o qual fomos criados, a comunidade.

O ritmo frenético que cada um de nós tem é a maior barreira para um relacionamento mais intenso. Além disso, nossas imperfeições e fragilidades que por mais que procuremos esconder, aparecem como uma etiqueta anunciando: esse é o meu defeito. Quem nos aceita quando transparecemos nossas franquezas? A quem permitimos ver nossa fragilidade? Confundimos amigos com pessoas cordiais – os cordiais estão sempre interessado em algo… não conseguindo, acaba a cordialidade.

O psicólogo Harry Stack Sullivan, afirma: “São as pessoas que deixam as pessoas doentes; são as pessoas que também as curam”. Os amigos verdadeiros enxergam o melhor naqueles que estão perto e também nos que estão mais distantes. John Ortberg em seu livro Somos todos (a) normais, fala do dilema do porco espinho – como aproximar-se sem sair ferido? O porco espinho é, em geral, um animal solitário. No fim do outono o porco espinho jovem, diz o autor, pensa em namorar. Os machos e as fêmeas ficam juntos por alguns dias antes do acasalamento. Eles se tocam com as patas dianteiras e as coisas vão acontecendo sem ferimentos.

Não existe sofrimento maior que o sofrimento da solidão. A solidão, disse Madre Teresa, é a lepra da sociedade moderna. Pessoas que possuíam uma multidão de conhecidos e seguidores, mas que nunca tiveram um só amigo, todas se arrependeram disso antes de morrer. Alguém já disse que é melhor comer salgadinhos na companhia de bons amigos que comer brócolis sozinho.

Conhecer e ser conhecido é um ato de alegria e satisfação humana, mas tem se tornado um dos maiores temores em nossa “sociedade líquida”.

Conta-se que um homem desesperado para encontrar um emprego candidata-se a uma vaga no zoológico.

– Bem, trata-se de uma tarefa pouco comum, mas tenho algo para você fazer – disse o diretor do zoológico.

– Nosso gorila morreu há algum tempo, e não temos dinheiro pata adquirir outro. Se você estiver disposto a usar um traje de gorila e fingir que um animal dessa espécie, o emprego será seu – prosseguiu.

Não parecia uma tarefa autêntica, mas, na opinião do homem, emprego é emprego, e ele aceitou. Depois de alguns dias de constrangimento, começou a personificar o animal, usando uma fantasia de gorila, e, em breve, tornou-se uma das atrações principais do zoológico. Certa manhã, enquanto saltava do trapézio, perdeu o equilíbrio e foi parar bem no meio da jaula ocupada por um enorme leão. O homem se pôs a gritar por socorro. Sabia que iria morrer. De repente o leão cochichou-lhe ao ouvido:

– Cale a boca, seu idiota, se não nós dois vamos perder o emprego.

A tendência de esconder-se que temos e de querer causar boa impressão, finda por nos privar de amizades sólidas e nos envolve no que os psicólogos chamam de “fenômeno do impostor”.

*Erivaldo Alves é pastor Batista com formação nas áreas Teológica, Filosófica, Gestão Escolar e Capelania. É membro da Academia Cabense de Letras.