Em 50 anos, glaciares perderam uma “Alemanha com 25 metros de espessura” em gelo no mundo
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Vanessa Oliveira/Um Só Planeta
Em 31.03.2025
Cinco dos últimos seis registraram o maior degelo da história. Perda de glaciares reserva perigos para segurança da água, economia e clima mundial
Neste 21 de março de 2025, o mundo celebrou o primeiro Dia Internacional dos Glaciares, um marco global que busca alertar sobre a aceleração do degelo nos polos, cujos impactos estão se espalhando de maneira alarmante por ecossistemas, economias e comunidades ao redor do mundo. Os glaciares, conhecidos como as “torres de água” do planeta, são fontes essenciais de água doce para milhões de pessoas, mas sua rápida perda ameaça comprometer não apenas o abastecimento hídrico, mas também aumentar os riscos de desastres naturais.
De acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM) e o Serviço Mundial de Monitoramento das Glaciares (WGMS), cinco dos últimos seis anos registraram o maior degelo da história.
Desde o início dos registros em 1975, os glaciares (excluindo as camadas de gelo da Groenlândia e Antártica) perderam mais de 9 trilhões de toneladas de gelo, o que equivale a um bloco do tamanho da Alemanha com 25 metros de espessura.
Entre 2022 e 2024, houve a maior perda de massa glacial registrada em três anos consecutivos. Em 2024, todas as regiões glaciais no mundo sofreram perda líquida de massa totalizando 450 bilhões de toneladas, o quarto maior valor registrado. Embora algumas regiões tenham apresentado perdas moderadas, como no Ártico Canadense e na periferia da Groenlândia, glaciares na Escandinávia, Svalbard e no Norte da Ásia tiveram a maior perda anual já registrada.
A mensagem neste Dia Internacional dos Glaciares, então, não é das melhores: esses gigantes gelados, que por muito tempo foram símbolo de estabilidade, estão desaparecendo em diversas regiões do mundo, e muitos deles não sobreviverão ao século 21.
Múltiplos impactos
Globalmente, existem mais de 275 mil glaciares, que cobrem cerca de 700 mil km². Esses glaciares, juntamente com os mantos de gelo dos polos, armazenam aproximadamente 70% da água doce do planeta. A perda de massas glaciais pode comprometer o fornecimento de água para centenas de milhões de pessoas que dependem dessa fonte de água durante os períodos mais quentes e secos do ano. No curto prazo, o degelo também aumenta a probabilidade de desastres naturais, como inundações, devido à liberação repentina de grandes volumes de água.
Um dos litígios climáticos mais importantes em andamento no mundo, atualmente, e com importantes repercussões para a justiça climática, envolve justamente o risco de degelo. Um pequeno agricultor do Peru está processando uma gigante da energia alemã alegando que as emissões de carbono da empresa aumentaram os riscos de inundação em sua cidade natal, e demanda que ela arque com parte dos custos de prevenção.
O degelo das glaciares não é apenas uma questão ambiental, mas também econômica. Como ressaltado no relatório de 2024 da OMM (State of the Global Climate 2024) , o desaparecimento dos glaciares coloca em risco diversas indústrias, desde a agricultura até o turismo, além de afetar diretamente comunidades que dependem de rios alimentados por glaciares para a produção de energia e água potável. A preservação dessas massas de gelo é, portanto, uma questão de sobrevivência, que exige uma ação urgente para evitar danos irreparáveis.
Aumento do nível do mar
A contribuição do degelo para o aumento do nível do mar é outro fator crítico. Entre 2000 e 2023, os glaciares perderam cerca de 6.5 bilhões de toneladas de gelo, o que resultou em um aumento de 18 milímetros no nível do mar. Esse número pode parecer pequeno, mas tem um impacto significativo.
Cada milímetro de aumento no nível do mar coloca entre 200.000 a 300.000 pessoas em risco de inundações anuais. A perda acumulada desde 1975 equivale a um aumento de 25 mm no nível do mar.
O gráfico mostra as mudanças acumuladas na massa global das geleiras desde 1975. A mudança acumulada é apresentada em gigatoneladas (Gt) no eixo y à esquerda, com os correspondentes valores de elevação do nível do mar (SLE/mm) no eixo y à direita. A perda acumulada desde 1975 totaliza cerca de 9.000 Gt, o que equivale a um aumento de 25 mm no nível do mar. — Foto: C3S/ECMWF/WGMS
Atualmente, o degelo das glaciares é a segunda maior causa do aumento do nível do mar, ficando atrás apenas do aquecimento dos oceanos, que também afeta a perda de gelo e vice-versa. Este fenômeno está agravando as condições de vulnerabilidade de diversas regiões costeiras, afetando tanto os países desenvolvidos quanto os em desenvolvimento.
“Glaciar do Ano”
Glaciar South Cascade, localizado na Cordilheira das Cascatas, em Washington (EUA). — Foto: U.S. Geological Survey
Em um esforço para promover a conscientização sobre a importância dos glaciares, o Serviço Mundial de Monitoramento das Glaciares (WGMS) também lançou a primeira edição do prêmio “Glaciar do Ano”. O Glaciar South Cascade, localizado na Cordilheira das Cascatas, em Washington (EUA), foi escolhido como o “Glaciar do Ano 2025”.
Este glaciar é monitorado desde 1952, oferecendo um dos registros mais longos e contínuos do comportamento das glaciares no Hemisfério Ocidental. O South Cascade Glaciar representa tanto a beleza natural das glaciares quanto a dedicação de cientistas que, por décadas, têm coletado dados essenciais para entender as mudanças glaciológicas.
Neste dia dedicado à conscientização sobre os glaciares, o WGMS destaca a necessidade urgente de reduzir as emissões de gases de efeito estufa, mitigar os impactos do aquecimento global e promover políticas eficazes para a preservação desses gigantes “reservatórios de água”.