Migrantes seguem confinados nas ilhas gregas, mesmo sem casos de COVID-19 nos campos

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Médicos Sem Fronteiras

Em 23.07.2020

Milhares continuam presos sem acesso a cuidados regulares de saúde e condições básicas de higiene

A situação dos migrantes nos campos superlotados nas ilhas gregas piorou ainda mais durante a crise causada pela COVID-19. Como falamos na semana passada, o governo iniciou uma ação de despejo de refugiados, que, sem acomodações seguras para onde ir, acabam vivendo nas ruas da capital Atenas.

Mas esse não é o único problema: os migrantes que seguem nos campos são vítimas das medidas de bloqueio relacionadas ao surgimento do novo coronavírus. A restrição de movimento imposta em lugares como Moria e Vathy, nas ilhas, provou ser nociva para as milhares de pessoas que vivem lá, sendo a principal causadora, por exemplo, de níveis crescentes de estresse e ansiedade.

Apesar de não haver casos de COVID-19 em qualquer um dos centros de acolhimento nas ilhas gregas e da vida ter voltado ao normal para a população local e para os turistas, essas medidas discriminatórias para solicitantes de asilo e migrantes continuam sendo estendidas a cada duas semanas. Hoje, esses homens, mulheres e crianças continuam cercados, em condições extremas, resultando em uma deterioração de sua saúde física e mental.

Maioria dos confinados é formada por mulheres e crianças

Quando a COVID-19 chegou à Grécia, mais de 30 mil solicitantes de asilo e migrantes estavam nos centros de acolhimento nas ilhas em condições terríveis, sem acesso a cuidados regulares de saúde ou serviços básicos.

Em março, a restrição de movimento imposta pelo governo grego em resposta à COVID-19 significou que essas pessoas, 55% das quais são mulheres e crianças, foram essencialmente forçadas a permanecer nesses centros superlotados e sem higiene.

“As tensões aumentaram dramaticamente e há muito mais violência desde o bloqueio. E a pior parte é que nem as crianças conseguem mais escapar”, diz Mohtar, de origem afegã (na foto, com seus filhos). Um deles, de 9 anos, é paciente da clínica de saúde mental de MSF para crianças, por causa de pesadelos. “A única coisa que eu podia fazer antes para ajudar meu filho era tirá-lo de Moria, para passear ou nadar no mar, em um lugar calmo. Agora, estamos presos”.

A continuidade das medidas de bloqueio não se justifica

MSF não pode se calar sobre essa discriminação flagrante, já que a restrição de movimento imposta aos solicitantes de asilo reduz drasticamente seu acesso já limitado a serviços básicos e cuidados médicos. Na fase atual da epidemia de COVID-19 no país, essa medida é absolutamente injustificada do ponto de vista da saúde pública, é discriminatória para pessoas que não representam um risco, contribui para sua estigmatização e para aumentar os riscos a que estão expostas.

“As restrições de movimento para migrantes e refugiados no campo afetaram drasticamente a saúde mental de meus pacientes”, diz Greg Kavarnos, psicólogo da clínica de sobreviventes de tortura de MSF em Lesbos. “Se você e eu nos sentimos estressados e facilmente irritados durante o período de bloqueio em nossas casas, imagine como as pessoas que passaram por experiências muito traumáticas se sentem agora que precisam ficar trancadas em um acampamento como Moria. Um lugar onde não podem encontrar um espaço privado e têm que ficar sempre na fila, por comida, banheiro, água, tudo”.

O que MSF propõe

A COVID-19 não deve ser usada como uma ferramenta para deter migrantes e refugiados. MSF pede a evacuação de pessoas, especialmente aquelas que pertencem a grupos de alto risco para a COVID-19, dos centros de recepção para acomodações seguras. As condições nesses centros não são aceitáveis em tempos normais. No entanto, tornaram-se locais ainda mais perigosos, já que as pessoas não conseguem se mover devido a restrições arbitrárias.