Invisibilidade
José Ambrósio dos Santos*
Em 15.02.2024
É noite fria de junho e chove.
Um andarilho caminha lento.
Encharcado e cansado, busca abrigo.
Sob uma marquise, é enxotado por outro andarilho em seu momento ‘glorioso’ de opressor.
– Aqui não! – esbraveja autoritário.
Um vira-latas para de coçar as feridas e rosna ameaçador, mostrando os afiados caninos.
Outros andarilhos já agasalhados riem, alheios à dor do companheiro de infortúnios.
Ele volta à calçada e segue, apenas segue.
A luz de um poste permite vislumbrar um semblante sombrio, melancólico.
Gotas de água da chuva… não, lágrimas. Lágrimas correm de seus olhos sonolentos encharcando ainda mais a barba grisalha.
Um passo; mais um passo.
A cidade começa a dormir, mas ele precisa seguir para lugar nenhum.
De um bar lhe chega aos ouvidos o som de uma música brega ou de sofrência.
Ele para e escuta. Apenas escuta.
Em frente a uma parada de ônibus apinhada de gente, um adolescente passa correndo e tenta lhe tomar o saco no qual carrega o pouco que lhe resta.
Ele tomba. Ninguém para lhe ajudar a levantar.
Ninguém para enxergar o fardo que o entorpece e o faz vergar e vagar.
E ele segue, cada vez mais invisível aos olhos de uma sociedade cada vez mais egoísta.
*José Ambrósio dos Santos é jornalista e integrante da Academia Cabense de Letras.
Imagem: Diário do Rio de Janeiro
O protagonista segue sua jornada, se sentindo cada vez mais invisível e negligenciado por uma sociedade egoísta.
O sentimento que uma pessoa nessa situação deve sentir é de profunda solidão, tristeza e desesperança. Ela se depara com a falta de empatia e compaixão dos outros, sendo ignorada e maltratada. A sensação de invisibilidade e abandono se intensifica, criando um sentimento de impotência e desamparo. A situação também pode gerar um sentimento de indignação e revolta diante da injustiça e da indiferença que enfrenta.
É. E saber que amanhã vai ser assim, depois de amanhã também ou ainda pior. Sem nenhuma perspectiva de que um dia possa ser diferente. Demais.
Essa realidade nós que realizamos a Ação AME Pessoas em Situação de Rua, vivenciamos bem de perto e realmente é dolorosa…
Parabéns Ambrósio, abordar temas tão reais que nos leva a grandes e importantes reflexões.
É, meu amigo. A indiferença é dolorosa.
Nossa realidade. Realidade vivenciada pelos nossos irmãos que vivem a margem da sociedade. Pessoas com deficiência, idosos, moradores de rua
Correto. A invisibilidade alcança muitos segmentos, e em todos eles é avassaladora.
Isso é o espelho da nossa sociedade. A invisibilidade nos cerca por todos os lados. Excelente texto 👏👏👏👏
É. Infelizmente. Em todas as cidades, em todos os lugares.
Dói na alma saber que há humanos que padecem tamanha invisibilidade. Sofrimento sem esperança de dias melhores. Retrato de uma sociedade egoísta.
Terrível. Uma cena triste de se ver, mas que está às nossas vistas todos os dias, há anos, há décadas e até mais.
Conheço situações como está de perto, infelizmente
É a triste realidade atual, está cada dia mais difícil de se encontrar um bom samaritano.