Mortes no Brasil citadas em relatório da ONU sobre racismo sistêmico
ONU News
Em 12.07.2021
Documento destaca os casos de Marielle Franco, Luana Barbosa e João Matos Pinto; Conselho de Direitos Humanos debate abusos do direito internacional contra africanos e afrodescendentes; alta comissária Michelle Bachelet apresentou informe global em Genebra.
A alta comissária da ONU para os Direitos Humanos pediu que os países tenham fundos para processos abrangentes junto a “medidas de indemnização” para lidar com os legados da escravidão, do domínio colonial e da discriminação racial.
Michelle Bachelet disse esta segunda-feira ao Conselho de Direitos Humanos, em Genebra, que ainda persiste a situação de comunidades, famílias e indivíduos “privados de vidas, meios de subsistência, recursos e direitos”.
Brasil
Vários casos do Brasil são mencionados no relatório sobre racismo sistêmico e abusos de direito internacional contra africanos e afrodescendentes por entidades de aplicação da lei, apresentado ao órgão pela alta comissária.
O estudo foi realizado na sequência do assassinato do afro-americano George Floyd, em 2020, depois de ter sido asfixiado numa abordagem da polícia na cidade de Mineápolis.
O documento aponta dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, realçando que somente em 2019, a taxa de mortalidade em intervenções policiais foi 183,2% mais alta “para pessoas de ascendência africana do que para brancos”.
A análise global deste tipo de incidentes aponta que em mais de 85% das fatalidades relacionadas à polícia estão três contextos: o primeiro é o policiamento de delitos menores, paradas de trânsito e buscas. Nestes casos, o nome da brasileira Luana Barbosa, assassinada em Ribeirão Preto, acompanha o de George Floyd e de Adama Traoré, da França.
Drogas
A segunda situação levantada pelo Escritório de Direitos Humanos é a intervenção dos “agentes da aplicação da lei como primeiros que respondem em crises de saúde mental”.
Por fim, aparece o caso de operações policiais especiais, conduzidas muitas vezes no contexto da “guerra às drogas” ou intervenções relacionadas a gangues. Neste ponto é mencionado o caso da morte do menor João Pedro Mattos Pinto, em São Gonçalo.
A recente liminar do Supremo Tribunal Federal proibindo operações da Polícia Militar nas favelas do Rio de Janeiro durante a pandemia é elogiada como um evento promissor “para abordar a conduta impune de agentes de aplicação da lei”.
Marielle Franco
A investigação global destaca que 70 defensores dos direitos humanos afrodescendentes foram mortos na América Latina no ano passado. Entre eles estavam 57 homens, 12 mulheres e uma mulher transexual.
O documento realça ainda morte da vereadora brasileira e ativista dos direitos humanos Marielle Franco, em 2018, que defendia afrodescendentes contra a violência policial e no reconhecimento dos seus direitos.
O estudo preparado durante um ano pretende impulsionar a dinâmica no combate ao racismo e seu impacto sobre os afrodescendentes.
Dados de uma ONG nos Estados Unidos destacam que afro-americanos representaram 28% dos mortos pela polícia em 2020. O ano iniciou com esta população compondo 41% dos presos, depois de ter sido um terço dos detidos em 2018.
Intimidação
Bachelet disse ao Conselho que a pesquisa “não conseguiu encontrar um único exemplo de um Estado que fez uma avaliação abrangente de seu passado ou contabilizou seus impactos nas vidas dos afrodescendentes hoje.”
Mas realçou haver algumas tentativas de busca da verdade através de pedidos de desculpas, litígio e memorização.
O relatório aponta que a repressão aos protestos antirracismo em alguns países deve ser vista num contexto mais amplo, em que cidadãos repudiando a prática enfrentam represálias incluindo assédio, intimidação e, às vezes, violência.
Na Europa e nos Estados Unidos, alguns ativistas da sociedade civil afrodescendente também relataram vigilância, ameaças à sua segurança, incluindo online, estigmatização e outras formas de pressão.