Notas retrospectivas e prospectivas
Enildo Luiz Gouveia*
Em 29.12.2021
Sonho com um dia em que a população possa, antes de votar, procurar saber como o seu candidato votou em pautas como estas do fundo partidário, além de outras pautas como a reforma trabalhista, o orçamento secreto, as privatizações, etc.
Há alguns anos li um livro que acredito dialogar com este ano 2021 e a pandemia. Trata-se do livro Armas, germes e aço – o destino das sociedades humanas (Jared Diamond, 2010) que descreve alguns casos da evolução e para os céticos, involução humana a partir das guerras, epidemias e riquezas. Ele resume seu livro numa frase: “A história seguiu diferentes rumos para os diferentes povos devido às diferenças entre os ambientes em que viviam e não devido a diferenças biológicas entre os povos.” (pág. 25). Alguns desavisados podem supor que se trata de um neodeterminismo geográfico, mas não é.
Este primeiro parágrafo acima é para dizer que a atual pandemia que temos no globo evolui de forma diferente para os mais diversos povos. No entanto, diante do avanço da ciência, particularmente da medicina, foi possível superar algumas limitações naturais que nós humanos temos para dar respostas às várias doenças, muitas das quais surgidas graças justamente a nossa reprodução acelerada que, associada ao modelo de vida, provoca os impactos socioambientais e entre esses, o surgimento, liberação e mutação de vírus, bactérias transmissoras de doenças. Tais doenças afetam muito mais as populações pobres, que possuem menos capacidade de resiliência. Não é exagero dizer que a seleção natural de Darwin se faz hoje através de uma seleção social e econômica que conduz milhares à morte. Vemos, por exemplo, que a pandemia da Covid-19 e outras que afetam a África não têm tanta importância nos meios de comunicação quanto o que se vê na Europa.
E quando pensamos que a humanidade pode aprender com seus próprios erros, eis que explodem pelo mundo os movimentos antivacina. Fico pensando que tais movimentos em alguns países como Brasil, EUA, Alemanha entre outros, são uma forma de tentar convencer os mais pobres a não se vacinarem e, assim, aumentar sua mortalidade. É uma teoria da conspiração, mas, exatamente possível e que, se confirmada, contribui ainda mais para a seleção natural dos humanos.
No campo político vemos que os governos mais democráticos, que mais valorizam a ciência, a cultura e a educação são os que apresentam melhores respostas no combate a pandemia vigente. Por sua vez, os governos negacionistas, como o do Brasil, brincam em tom de sarcasmo com o sofrimento do povo. Não se trata apenas de negar a ciência, mas de fazer pouco para uma outra pandemia: a da fome.
Como nenhum governo de sustenta sozinho, podemos acrescentar aqui o papel do Legislativo. Diante de um quadro agravante de miséria do povo, o Brasil aprova um fundo partidário de mais de R$ 5 bilhões para as eleições de 2022. Os partidos gozarão de recursos suficientes para eleger suas bancadas. Sonho com um dia em que a população possa, antes de votar, procurar saber como o seu candidato votou em pautas como estas do fundo partidário, além de outras pautas como a reforma trabalhista, o orçamento secreto, as privatizações, etc. Só assim se poderá contribuir com a mudança para melhor a partir do ato de votar. Mesmo diante de tanta fome, precisamos votar com a cabeça!
*Enildo Luiz Gouveia é professor, teólogo, poeta, cantor e compositor. É membro da Academia Cabense de Letras – ACL.
Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do blog Falou e Disse.
Foto destaque: revistagalileu.globo.com