O Elogio da Sabedoria
Jénerson Alves*
Em 07.01.2022
O ensaio denominado ‘O Elogio da Loucura’, de Erasmo de Rotterdam, é um dos grandes clássicos da filosofia. A sociedade da época é satirizada na obra, que representa a loucura como uma mulher ornada de guizos. Em contraste com o tom irônico do livro do humanista, vemos no capítulo VIII do livro bíblico de Provérbios um texto que pode ser chamado de ‘O Elogio da Sabedoria’, nas palavras do proeminente teólogo brasileiro Isaltino Gomes Coelho Filho. Na literatura sapiencial hebraica, a Sabedoria clama, buscando a quem possa ouvi-la.
Ao deparar-se com esse texto, deve o leitor atentar para o fato de que a visão acerca da Sabedoria presente no livro de Provérbios é semita, não grega. O autor norueguês Thorleif Boman, autor de uma obra monumental em que distingue o pensamento hebraico em comparação ao grego, explana que a mentalidade hebraica é dinâmica, vigorosa, ao passo que a grega é harmônica, estática. O termo hebraico para sabedoria é ‘hokhma’, que traz a ideia de uma preocupação com o modo de viver. Em suma, o hebraico pensa de forma concreta, enquanto o grego pensa de forma abstrata.
O texto de Provérbios dialoga com a Carta de Tiago, no Novo Testamento. O irmão do Senhor vai além e apresenta dois tipos de sabedoria: uma que vem do alto, outra que é terrena. A primeira é “primeiramente, pura; depois, pacífica, indulgente, tratável, plena de misericórdia e de bons frutos, imparcial, sem fingimento” (Tg 3:17); enquanto a segunda, terrena, é “animal e demoníaca”, por ser mesclada de inveja e sentimento faccioso (cf. Tg 3:15-16). Desta feita, em ambos os casos a sabedoria não se trata de uma entidade mística ou de uma energia diáfana, mas de uma substância que norteia nossos passos aqui e agora, no mundo físico.
Hoje, muitos se jactam por serem fartos de conhecimento. Contudo, os frutos indicam qual tipo de sabedoria está sendo cultivado. Onde há discórdia, ira e dissensão, certamente não está sendo ouvida a Sabedoria de Provérbios. Isso é muito perigoso, pois é dela que provém o conhecimento acerca do jeito reto de viver. E como encontrá-la? Quem sabe através do conselho de Tiago: “Se, porém, algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá liberalmente e nada lhes impropera; e ser-lhe-á concedida” (Tg 1:5).
*Jénerson Alves é jornalista e membro da Academia Caruaruense de Literatura de Cordel. Escreve às sextas-feiras.
Foto destaque: O sonho de Salomão, de Luca Giordano