A guerra pela água

Por

Enildo Luiz Gouveia*

Em 02.07.2020

A  aprovação pelo Senado e a possível sanção presidencial do chamado Marco Legal do Saneamento Básico levantou no meio acadêmico e político várias discussões. Infelizmente, boa parte da mídia nacional não deu o devido destaque ao assunto, sobretudo em relação a dar voz ao contraditório.

A água é elemento fundamental da vida e está presente em absolutamente tudo que compramos, fazemos, comemos e respiramos.  O corpo de um humano adulto é 70% água e ainda assim, necessitamos adicioná-la regularmente ao organismo para compensar a água perdida pela transpiração, pela urina etc. No Brasil, país que detém o maior percentual de água doce do mundo (aproximadamente 12%), o acesso a água em quantidade e qualidade revela mais um traço das desigualdades sociais e espaciais existentes. Os chamados bairros nobres em geral têm abastecimento regular e quando não, conseguem suprir suas necessidades através da compra de água ou ainda, por perfuração de poços nem sempre regularizados. Já nos bairros periféricos, a exemplo dos bairros da Região Metropolitana do Recife (RMR), o sistema de rodízio no abastecimento e até a inexistência de água nas torneiras é uma realidade crítica. Junta-se a isto, a quase completa ausência de saneamento básico que, dentre outros problemas, contribui para a degradação da qualidade das águas.

É conhecida a incapacidade política e financeira do Estado brasileiro em conseguir resolver esta questão. Daí o motivo pelo qual o governo, através do Marco Legal do Saneamento, abrir a possibilidade de uma “privatização da água”. Para os liberais de prontidão, um verdadeiro oásis financeiro. Para a população, a dúvida.

A lei Federal 9.433/1997 também conhecida como Lei das Águas é baseada em princípios internacionais e define que a água é um bem de domínio público dotado de valor econômico. Longe de representar um alento, esta lei tem sido desrespeitada não apenas pelo poder público, como também pela iniciativa privada. Assim, a população fica “no meio do tiroteio” de interesses nada humanitários.

A garantia de que a água continue sendo de domínio público e que esteja em primeiro lugar a serviço do bem-estar da população e dos serviços ecológicos, só será conseguida através da consciência e da organização popular, que deve estar pronta para a nova guerra pela água.

*Enildo Luiz Gouveia é professor do IFPE/Campus Recife e tem doutorado em Geografia.

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