Os senões do senão
Jénerson Alves*
Em 05.08.2022
A Gramática é como a vida. As normas surgem a partir do uso, e a forma que usamos a língua indica nossos pensamentos, abrindo janelas para várias reflexões. Se não for assim, posso até pedir desculpas, senão serei defenestrado. Entretanto, permanecerei pensando do mesmo jeito. Inclusive, recentemente, fiquei um tanto fascinado com o ‘senão’ e o ‘se não’.
A diferença desses dois termos abarca várias circunstâncias. Aprendi nas aulas de português que o ‘senão’, dependendo do caso, pode ser uma conjunção adversativa, uma preposição, um advérbio ou mesmo um substantivo (sinônimo de ‘defeito’ ou ‘problema’). Já ‘se não’, separado, consiste na conjunção ‘se’ associada ao advérbio ‘não’, e pode ser substituído por ‘caso não’.
Um exemplo claro está no Salmo 124, versículo 1º: “Se não fora o Senhor, que esteve ao nosso lado, ora diga Israel”. O texto é um verdadeiro hino de gratidão a Deus por uma libertação após uma crise. Percebe-se que o início do cântico poderia ser trocado por ‘caso não fora o Senhor…”.
Outro exemplo também está no livro de Salmos: “A quem tenho eu no céu senão a ti?” (73:25). Aqui, o salmista declara que toda a sua alegria e confiança estão centradas em Deus. E o ‘senão’, junto, significa ‘exceto’, ou ‘a não ser’.
Meditar sobre esses textos gera reflexões mais do que gramaticais. Todas as vezes que os ‘senões’ (percalços) da existência se levantarem, pretendo erguer os olhos e enxergar Aquele que está no céu (e no trono do meu impuro coração). Se não fosse Ele, eu nada seria. E não me resta mais nada na vida, senão amá-Lo mais do que a mim mesmo.
*Jénerson Alves é jornalista e membro da Academia Caruaruense de Literatura de Cordel. Escreve às sextas-feiras.
Imagem: PDPics/Pixabay