Banalização da violência na cobertura jornalística

Por

Enildo Luiz Gouveia

Em 22.07.2020

Confesso que não há nada mais que me incomode que comer em algum lugar com música em volume alto e principalmente com TV ligada em programas policiais ditos jornalísticos. É lamentável que parte da população dê tanta audiência a este tipo de programa e tenha nele sua principal de fonte de “informação”.

Recentemente me vi numa situação que, por alguns instantes, prestei um pouco de atenção num desses programas. Três aspectos me chamaram a atenção: as notícias veiculadas, o vocabulário e os gestos do apresentador. Sob o discurso de mostrar a realidade, se faz propaganda explícita a favor da vingança como forma de justiça. Atacam-se os direitos de imagem das pessoas, exploram-se as periferias que são relatadas como espaços de morte, tráfico, estupros etc.

Outra coisa que me chama atenção é o enfoque assoberbado sobre determinadas notícias, em geral de assassinatos na periferia. Estas são exaustivamente repetidas, criando na população certa vontade de “fazer justiça com as próprias mãos”. O modelo de programa não é novo, pois, lembro-me de programas semelhantes já no final da década de 1980 e também foi mostrado no filme nacional Tropa de Elite 2.

Os efeitos que estes programas causam no imaginário coletivo que passa a encarar a morte como apenas mais um “evento” no bairro deve ser objeto de estudos por parte dos psicólogos. De minha parte, prefiro que a realidade seja mostrada sem caricaturas nem apelos.

Penso que são dois os resultados nefastos desse tipo de propaganda: parte da população passa a viver amedrontada, alimentando uma visão negativa do seu lugar, e outra parte da população torna-se intolerante, disposta a agir violentamente nas situações cotidianas, correndo o risco de cometer injustiça em nome da “justiça”.

*Enildo Luiz Gouveia é professor de Geografia do IFPE e membro da Academia Cabense de Letras.

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