O Tempo está se arrastando?
Dorgival Soares da Silva*
Em 09.06.2020
Se você está ‘ligado’ no tempo, é porque, geralmente, ele está ‘passando’ lentamente. Quanto mais se arrasta, mais se percebe o tempo. E, nos lembraremos dele assim, arrastado.
Mas, raramente se nota quando o tempo está ‘voando’. Ele voa justamente quando não o estamos acompanhando.
“Fugit irreparabile tempus” (Virgílio). Algo como “o tempo voa, irreversivelmente”
O tempo não é um sentido, como a visão ou audição. Ele nos chega de maneira indireta, normalmente por meio daquilo que ele contém.
“Eventos são perceptíveis, mas o tempo não é”, segundo J. J. Gibson.
O tempo não é uma coisa, mas uma passagem pelas coisas; não é um substantivo, e sim um verbo.
Marcar a passagem do tempo é reconhecer mudança. Não experimentamos tempo, só a sua passagem.
“O que estou medindo é a impressão que os fenômenos que passam deixam em você, que persistem quando já passaram: é isso que meço como sendo a realidade presente, não as coisas que passaram de modo que se pudesse formar a impressão. A impressão em si mesma é o que eu meço quando meço intervalos de tempo.” (Santo Agostinho)
John Wearden estuda a relação humana com o tempo. Numa das suas pesquisas com estudantes descobriu que, para eles, a experiência de o tempo passar mais rápido que o normal era mais comum do que a de passar devagar.
O tempo consistentemente se acelerava quando as pessoas estavam ocupadas, felizes, concentradas ou socializando e, se retardava no trabalho ou quando se estava entediado, cansado ou triste.
Em artigo recente, Silvio Meira cita que “pesquisadores já documentam sentimentos de tristeza e tédio ligados a uma sensação de desaceleração. Para 50% das pessoas, o tempo está passando mais lentamente – e só 24% acham que está mais rápido.”
O desarranjo trazido pela pandemia descontinuou o ritmo de muitos, por desemprego, aprendizagem e adaptação de novos hábitos e recursos, novos ambientes (o domicílio) – efeito semelhante ao se chegar num novo emprego -, atenção ao risco da doença, preocupações com pessoas queridas etc.
A sensação de que o tempo diminuiu seu ritmo induz, aos despreparados para tal, à irritabilidade, desconforto e, à depressão.
“Antes da pandemia, entre 5 a 7% da população dos EUA atendia a critérios para ter diagnóstico de depressão. Dependendo da definição, cerca de 50% da população americana se encontrava deprimida – e isso antes dos protestos violentos dos últimos dias.” (Silvio Meira)
Que efeitos psicológicos e sociais herdaremos? Não sou pessimista. Somos adaptáveis. Até lá, aturemos-nos.
*Dorgival Soares da Silva é administrador de Empresas. Pernambucano de Vitória de Santo Antão, está radicado em São Paulo desde 1992.
Os artigos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Blog Falou e Disse
Ter cultura e inteligência, não significa obrigatoriamente ter juízo. Foram meses brigando com você, pedindo para que você perenizasse o material, que brilhantemente compartilha com a sua audiência e amigos.
Então, finalmente, nos contempla com este blog.
Seja bem-vindo ao mundo da Razão!
Visão clínica e assertiva… realmente estamos enfrentando o ócio sem precedentes.