Natal, um santo silêncio
Jénerson Alves*
Em 25.12.2020
“As pessoas grandes têm a mania de querer, a qualquer preço, explicar o inexplicável”. Certamente quando Maurice Druon fez esta constatação, em ‘O menino do dedo verde’, sequer passou pela cabeça dele o exemplo da Sagrada Família. Entre tantas lições que podemos ter com José e Maria, uma delas é o silêncio.
Se fizermos uma rápida passagem pelos evangelhos, é possível perceber que os escolhidos para criarem o Filho de Deus mantiveram a discrição ao longo da vida. Quando Maria recebeu a notícia que estava grávida, ela não alardeou. Inclusive, São Lucas registra em diversas passagens que ela “guardava e meditava tudo no seu coração”.
Semelhantemente, quando José planejou desfazer o elo com a noiva também não proclamou a decisão aos quatro cantos, mas “intentou deixá-la secretamente”. São Mateus explica que José assim pensou por ser justo e não querer infamá-la. Ao contrário do que muitas pessoas podem pensar, José não era apenas “um cara legal”. O texto é claro: ele era justo, isto é, a justiça fazia parte do seu ser. Deixar Maria seria uma forma de impedir que ela fosse acusada de adultério e apedrejada, segundo a lei vigente na época.
Enquanto os pais do Senhor Jesus mantiveram silêncio sobre a vinda do Rei do reino de Deus, os céus se encarregaram de proclamar as boas-novas. O professor Jaziel Guerreiro Martins explana: “(…) o evangelista faz questão de introduzir no nascimento de nosso Senhor a universalidade da revelação de Deus e de seu Evangelho: sim, ele é revelado a judeus e gentios igualmente: aos judeus com a aparição dos anjos aos pastores no campo (Lucas 2) e aos gentios, aqui representados pelos sábios do Oriente, pela chamada ‘Estrela de Belém’”.
Quão importantes são os ensinamentos que José e Maria nos trazem! No contexto hodierno, o barulho abafa o silêncio. Pessoas repletas de ‘certezas’ e ‘verdades’ vociferam conceitos e sentenças, fazendo da boca uma arma contra seus irmãos (aos quais chamam de ‘inimigos’). Que possamos aprender com os ‘pais’ do Filho de Deus e cultivarmos o dom do silêncio, por respeito à vida e ao próximo. Mais cedo ou mais tarde, a Luz brilhará, assim como foi naquele dia, sobre a humilde manjedoura de Belém.
*Jénerson Alves é jornalista e membro da Academia Caruaruense de Literatura de Cordel. Escreve às sextas-feiras.
Foto destaque: Gerd Altmann/Pixabay