Reabrir as escolas: quando, onde e como?

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Foto: Unesco

Stefania Giannini, Robert Jenkins e Jaime Saavedra*

Em 19.06.2020

Faz cerca de dois meses que as escolas foram fechadas em mais de 190 países, o que afetou 1,57 bilhão de crianças e jovens – 90% da população estudantil de todo o mundo. Tais fechamentos ocorreram em rápida sucessão, como uma medida para conter o vírus da COVID-19. Com a mesma rapidez, os governos implementaram medidas para continuar o ensino por meio de plataformas, televisão e rádio, no que consistiu o experimento de maior alcance na história da educação. Contudo, quando se trata de reabrir escolas, o ritmo é muito mais incerto. Segundo dados da UNESCO, 100 países ainda não anunciaram uma data para a reabertura das escolas, 65 têm planos de reabertura parcial ou total, enquanto 32 terminarão o ano acadêmico online. Para 890 milhões de estudantes, no entanto, o calendário escolar nunca esteve tão indefinido.

Quando e como reabrir as escolas é, hoje, uma das decisões mais difíceis e sensíveis das agendas políticas. É seguro reabrir as escolas, ou existe o risco de reativar os contágios? Quais são as consequências para a saúde mental e para o desenvolvimento social das crianças? Os estudantes envolvidos no ensino a distância estão realmente aprendendo? E, quando chegar a hora, como as escolas garantirão o retorno dos estudantes, e como elas ajudarão aqueles que ficaram para trás durante o período de fechamento?

A decisão é complexa porque a pandemia continua a evoluir, e não de uma forma linear. Não há evidências suficientes sobre os riscos de transmissão. Em todos os lugares, o isolamento será suspenso de maneira gradual, com muitos pontos de interrogação sobre como o processo será administrado, em grande parte porque o vírus apresenta muitas características que nós simplesmente desconhecemos. Entretanto, mesmo com as incertezas atuais, os governos podem antecipar e se preparar para reabrir as escolas com sucesso, colocando em prática as medidas de segurança necessárias.

Recentemente, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, pediu aos governos e aos doadores que priorizem a educação para todas as crianças, incluindo as mais marginalizadas. A Coalizão Global de Educação foi criada para apoiar os governos no fortalecimento do ensino a distância e na facilitação da reabertura das escolas.

Como se poderia esperar, quanto mais tempo durar a interrupção da educação escolar, maior será a perda de aprendizado. Assim, quanto mais cedo as escolas puderem reabrir, menores serão os riscos de ocorrerem danos de longo prazo nas jornadas de aprendizagem e no bem-estar de milhões de crianças. Preocupa-nos o fato de que o fechamento prolongado das escolas exacerbe as desigualdades, aprofunde a crise de aprendizagem e exponha as crianças mais vulneráveis a um maior risco de exploração. Devido a outras crises, nós sabemos que, quanto mais tempo as crianças vulneráveis estiverem fora da escola, menor será a probabilidade de elas voltarem a frequentá-la. Após a crise do ebola na África Ocidental, vimos um aumento nas taxas de exploração sexual e de gravidez na adolescência, o que demonstra como as meninas correm maiores riscos durante o fechamento das escolas.

As escolas não são apenas locais de aprendizagem. Elas fornecem proteção social, alimentação, saúde e apoio emocional, elementos que são uma garantia de vida para os mais desfavorecidos, e isso se aplica a todos os países, aos de baixa e aos de alta renda. O Programa Alimentar Mundial (WFP) estima que 370 milhões de crianças não estão recebendo refeições devido ao fechamento das escolas. Como metade dos estudantes de todo o mundo não têm acesso a um computador em casa, a chance de haver perda de aprendizagem durante este período é quase inevitável. O tamanho dessa perda dependerá da eficácia de canais alternativos que estão sendo amplamente utilizados. Porém, de qualquer modo, ela nunca será totalmente recuperada. Acrescente-se a isso o isolamento social de amigos e professores, a ansiedade, o deslocamento e, nos piores casos, as possíveis mortes de entes queridos. Com tudo isso, a cada dia que passa aumentam os danos psicológicos causados pelo fechamento das escolas.

Esta não é uma questão simples, de apenas avaliar riscos e benefícios. A prioridade absoluta é salvaguardar a vida e o bem-estar das comunidades, incluindo as crianças e os professores. Mesmo que as datas ainda não possam ser anunciadas, o planejamento para a reabertura das escolas deve começar agora.

Em geral, é necessário consultar e se comunicar com pais, professores, estudantes e comunidades, para entender suas preocupações e resolvê-las. Isso garante a confiança e o apoio à reabertura de uma escola, um pré-requisito para fundamentar as políticas educacionais, o financiamento e as medidas operacionais. A principal mensagem deve ser a de que essas decisões são específicas aos diferentes contextos e dependem da capacidade das escolas para mitigar os riscos de transmissão de infecções e promover comportamentos saudáveis. As condições básicas a serem avaliadas incluem o acesso a sabão e água limpa para a lavagem das mãos e protocolos de distanciamento social. A segurança também pode se dar pela redução do número de estudantes no local (por meio de turnos duplos), pela priorização dos anos iniciais ou de grupos específicos, ou pela continuação do uso de uma abordagem de aprendizagem mista.

Depois da segurança, é necessário que se enfoque o processo de recuperação da aprendizagem – desde a avaliação dos resultados da aprendizagem durante o fechamento das escolas, de modo a garantir o bem-estar socioemocional dos envolvidos e tomar medidas para lidar com as disparidades, por meio de abordagens corretivas. O apoio aos professores e ao seu desenvolvimento profissional será essencial para o sucesso.

A reabertura das escolas durante esta crise global não é um retorno ao normal. Nós devemos fazer as coisas não apenas de maneira diferente, mas melhor. Considerando que os estudantes mais vulneráveis corriam maiores riscos de serem deixados para trás pelas modalidades de ensino a distância, eles deveriam ser a prioridade de toda e qualquer estratégia de volta às aulas. As escolas precisam trazê-los de volta de forma proativa e fornecer-lhes apoio. Isso pode envolver abordagens de aprendizagem flexíveis, práticas para ampliar o acesso a crianças e jovens que não frequentam a escola, bem como a crianças e jovens deslocados e migrantes, e originários de minorias e outros grupos excluídos. Será necessário reconhecer o desafio particular de meninas e jovens mães, as quais podem vir a enfrentar estigmas e leis discriminatórias de reingresso à escola que as impeçam de ter acesso à educação. Para alguns estudantes, principalmente os que estão na idade da educação secundária, é muito alto o risco de que permaneçam afastados por um longo período da escola para nunca mais voltar. Esse risco deve ser reduzido por políticas públicas ativas, como campanhas de comunicação destinadas àqueles em situação de maior risco, interações com famílias e comunidades, ou o fornecimento de bolsas de estudo.

Como foi apresentado no relatório do Banco Mundial sobre o impacto da pandemia sobre a educação e as respostas de políticas públicas, nós precisamos capitalizar as inovações e reunir lições importantes sobre o uso da tecnologia nesta escala sem precedentes para a mudança para um novo normal. Isso pode constituir um marco de virada no uso de novas pedagogias para enfrentar a crise da aprendizagem e fornecer modelos de aprendizagem mais inclusivos e criativos. Agora é a hora de reconstruir melhor, de tornar os sistemas educacionais mais inclusivos e mais bem preparados para enfrentar e superar possíveis crises no futuro, incluindo as relacionadas ao clima. E, mais do que nunca, este é um momento para proteger a educação e seus recursos orçamentários das consequências socioeconômicas da pandemia.

Como nós compartilhamos a mesma aspiração de que as escolas reabram oportunamente e com segurança, bem como para salvaguardar o direito à educação de todas as crianças e de todos os jovens, o UNICEF, a UNESCO, o Programa Alimentar Mundial e o Banco Mundial uniram forças para produzir orientações que oferecem conselhos práticos às autoridades nacionais e locais sobre como manter as crianças seguras quando voltarem à escola. O “Marco de ação e recomendações para a reabertura das escolas” foi elaborado para servir como uma ferramenta flexível para formuladores de políticas e planejadores, destacando todos os fatores que farão com que essa experiência seja bem-sucedida para estudantes, professores, diretores, pais e a comunidade em geral.

O objetivo principal é o melhor interesse da criança e do jovem. Nosso objetivo consiste em reabrir escolas melhores, mais saudáveis e mais seguras. E esta é uma oportunidade para construir sistemas educacionais mais inclusivos, que apoiem TODAS as crianças e TODOS os jovens para aprenderem e serem mais resilientes em crises futuras. Nós devemos aproveitar esta oportunidade.

*Stefania Giannini, diretora-geral adjunta de Educação da UNESCO / Robert Jenkins, chefe de Educação e diretor associado do UNICEF / Jaime Saavedra, diretor global de Educação do Banco Mundial.

Artigo publicado na página da Organização das Nações Unidas (ONU).

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