Empatia, antipatia e desumanidade

Por

Ayrton Maciel*

Em 25.06.2021

O Brasil superou a marca trágica de 500 mil mortes pela covid-19, e em mais cinco dias beira 510 mil mortos. Políticos, oposicionistas e governistas, declararam em notas ou em suas redes sociais o seu pesar pelo sofrimento e desalento de milhões de famílias brasileiras. Pode não ser sincero, mas é civilizado. O personagem mais simbólico do imaginário de nação, o seu líder, porém, manteve-se em silêncio. Sem nota oficial ou pronunciamento em suas redes. Dois dias depois, indagado pela imprensa, deu um “lamento” protocolar: Jair Bolsonaro, o “presidente”, o líder sem empatia.

Solidariedade não traz ninguém de volta, mas a sua falta aprofunda o vazio do espaço deixado em cada filho e filha, mãe e pai, avô e avó. Sem surpresa, Bolsonaro. Seu lamento foi diplomático – estando no mais alto cargo – para tantas perdas que transtornaram o país, colocando-o em segundo lugar em mortandade pela covid-19 no mundo. Essa não foi nem será jamais uma questão política, é a indiferença de alguém sem empatia, aquele que não tem a humanidade como valor de vida. Alguém que, proclamando-se cristão, não entende compaixão como um dos seus princípios.

Empatia: capacidade de imaginar-se no lugar de outro, de compreender e sentir além de si. Antipatia: aversão à pessoa ou coisa, que pode ser irracional, gratuita. Repugnância: repulsa, asco à pessoa ou coisa. Desumanidade: crueldade, atrocidade, sem abater a consciência.

A pandemia de covid-19 realçou a empatia, substantivo pouco praticado, que não era cultivada e externada por muitos de nós, e que desencadeia a solidariedade, o voluntariado, a filantropia. Em muitos nos quais não se apostava um vintém em caridade ou ato de empirismo doador, revelou-se o humano, cedendo um pouco e até partilhando o pouco. Passada a tormenta, que se preserve um novo olhar sobre coisas e pessoas, que não se retorne ao desdém, pois triste terá sido a verdade se tiverem limitado a compassividade à pandemia.

Infame é concluir que nem todos cederam. Há os que continuam a negar, a não tolerar, a não se compadecer. Talvez por culto à personalidade, menos por ideologia. São antipáticos à ciência, à doação. Jair Bolsonaro é mais do que antipatia, ele é repugnância. A quem não o segue, a quem não compartilha do seu desprezo.

Bolsonaro não está na dor do outro, no vazio de quem perdeu alguém. Não tem empatia no individual nem no coletivo. Então, passeia de jetski, de moto e de barco sem culpa nem remorso. O mundo dele é perfeito, e ele é lamentavelmente autêntico. Os que perderam pais e filhos o condenam a estar no registro do lado obscuro da história. Bolsonaro já é a parte oral e escrita que envergonha as atuais e futuras gerações.

*Ayrton Maciel é jornalista. Trabalhou no Dario de Pernambuco, Jornal do Commercio e nas rádios Jornal, Olinda e Tamandaré. Ganhador do Prêmio Esso Regional Nordeste de 1991.
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