João Furiba me fez lembrar de Chesterton
Jénerson Alves*
Em 03.02.2023
No dia 1º de fevereiro, completaram-se quatro anos da morte de João Batista Bernardo. Mais conhecido como ‘João Furiba’, ele foi um dos maiores repentistas do Nordeste. Nascido do tamanho de um preá, viveu os primeiros dias dentro de uma caixa de sapatos e quase foi comido por uma coruja, segundo ele mesmo narrou no livro ‘Furiba falando a verdade’ (Editora Coqueiro).
Entre as muitas histórias de cantoria, quero registrar um relato que considero muito interessante. Nos idos de 1949, João Furiba, ainda iniciante na viola, foi cantar com João da Silveira, então já consagrado repentista. Silveira estava trajado com um terno novo, muito bonito, ao passo que Furiba não estava bem vestido. Zombando do oponente, Silveira concluiu uma estrofe assim: “Que parece um esmoler / pedindo esmola na feira”. Com simplicidade e um certo tom profético, João Furiba respondeu:
“Colega João da Silveira,
Teu orgulho te consome;
Essa roupinha se acaba,
Esse corpo a terra come,
Ainda chegará tempo
Que ninguém fala em teu nome”.
Lembrar dessa estrofe de Furiba me serviu de gatilho para lembrar de G. K. Chesterton – sim, minha mente traça caminhos desconhecidos. Para mim, uma das frases mais marcantes do ensaísta inglês é a seguinte: “Em toda mente sã, há a sugestão de que a religião ensina antes a cavar do que a escalar; de que se entendermos o barro da terra entenderemos tudo”.
Em tempos onde tantos querem escalar nos lombos do semelhante, é essencial saber cavar, perceber-se barro. Lembrar de que a terra comerá nosso corpo é banhar-se em um rio de humildade. Essa é uma daquelas verdades universais, captadas por pessoas sensíveis e inteligentes, como Chesterton (e João Furiba).