O ser humano e sua sombra

Carlos Luiz Gomes*

Em 16.07.2020

Em algum momento de nossas vidas, já fomos surpreendidos com uma pessoa do nosso convívio intimo agindo grosseiramente, violentamente ou imoralmente. Nesse instante, ficamos atônitos e passamos a condenar o ato do indivíduo. Num momento de raiva, aquele sujeito pacato entra numa discussão frívola e, de repente, transforma-se em um ser violento e parte para a agressão física ou verbal. O amigo honesto entra na política e se revela um corrupto. Quem já não agiu assim, expondo seu lado nefasto, às escondidas ou às claras? Todo ser humano tem a sombra e a luz, o Deus e o diabo. A sombra é o nosso lado escuro, aquilo que nos macula, que a sociedade qualifica de mal ou imoral. Este conteúdo psíquico sombrio está presente no nosso inconsciente, atuando involuntariamente quando queremos executar ações desagradáveis que podem nos comprometer moralmente.

No sujeito ¨normal¨ existem os arquétipos persona e sombra; a persona é a nossa máscara que usamos para viver de acordo com a moral social e as regras do mundo; em casa o sujeito tem uma personalidade (real), fora deste ambiente ele usa máscaras adaptativas. É comum a sombra se revelar num ambiente em que o sujeito não necessita de máscaras, por exemplo, no seio familiar.  O sujeito na igreja é um santo, no seu lar ele assume seu lado demoníaco.

Existe aquele indivíduo que reprime inconscientemente suas sombras, apresentando-se como uma ovelha dócil, mas no seu âmago tem um lobo devorador pronto para agir. Tem aquele sujeito que faz questão de mostrar sua sombra, muita vezes, a utiliza para impor medo aos outros. Gaba-se por ser mau-caráter. As sombras mais perversas podem ser incorporadas às personalidades dos seres humanos. Neste caso, trata-se de uma doença mental denominada de transtorno de personalidade antissocial. Vejamos dois exemplos: 1- psicopata: aparenta ser normal, às vezes encantador e manipulador; capaz de agir às escondidas, inescrupulosamente, para obter seus êxitos. Não tem empatia e remorsos, embora saiba o porquê faz a maldade; 2- sociopata: é um psicopata que age na coletividade. O exemplo mais conhecido é o de Hitler, que usou todos os seus instintos perversos para matar seis milhões de judeus.

Muitas vezes a sombra é projetada no outro. Esta projeção se dá quando o indivíduo projeta características em alguém, que podem existir ou não. Entretanto, este conteúdo psíquico pode vir deste indivíduo projetor. Tudo aquilo que o outro tem na sua personalidade e nos irrita profundamente, pode estar presente inconscientemente em nós, por exemplo: existe o homofóbico que inconscientemente camufla sua homossexualidade, mas por algum motivo não assume esta identidade. O fenômeno da projeção está presente em nossas vidas mais do que imaginamos: na inveja, no racismo, nas religiões, nas famílias, nas empresas, etc.

O sábio vive bem com Deus e seu diabo. Saber lidar com a nossa sombra é um atitude que pode ajudar-nos a chegar à nossa luz (evolução). Domá-la é um desafio, mas é possível, desde que reconheçamos que não somos seres perfeitos e angelicais.

Carlos Luiz Gomes é psicólogo e membro da Academia Cabense de Letras.

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