Empatia para vencer preconceitos

Por

José Ambrósio dos Santos*

Em 29.11.2024

“Na cabeça delas (das funcionárias) eu havia ido ali apenas para tirar uma foto. Não, eu não fui só tirar a foto. Eu exerci cada profissão. E foi maravilhoso.”

Colocar-se no lugar do outro, experimentar o que alguns profissionais vivenciam no dia a dia em algumas das menos prestigiadas atividades, de modo a as valorizar e chamar a atenção para a desatenção da sociedade em relação a esses trabalhadores. Foi o que fez o radialista Ely José, o Batata, atuando como gari, agente de saúde, lavador de pratos e cobrador de ônibus nas vésperas do seu aniversário de 61 anos de idade, completados no dia 27 de setembro.

Fundador e diretor da Rádio Comunitária Calheta FM, Batata é um dos mais populares e respeitados comunicadores sociais do Cabo de Santo Agostinho. Como está constantemente nas ruas e em eventos, até por dever de ofício, conhece muito bem a cidade e a sua gente. E sabe da quase invisibilidade desses profissionais que trabalham duro diariamente para o bem-estar da população.

“Queria estar no lugar do outro, vivenciando profissões que para a maioria das pessoas são invisíveis. Esses trabalhadores, garis, agentes de saúde, cobradores de ônibus e lavadores de pratos realizam trabalhos importantes, mas não são reconhecidos e passam despercebidos.”

Batata passou uma manhã desempenhando cada uma dessas funções e ao final do primeiro expediente almoçou com os profissionais em seus locais de refeições.

Devidamente fardado como gari, ele varreu parte do Mercadão, no centro da cidade. Trabalho cansativo pelo qual não recebia nem mesmo um bom dia até por parte dos comerciantes.

“Os proprietários dos boxes nem me perceberam. Eles só atentaram para a presença do gari quando algumas pessoas me reconheceram e me cumprimentaram. Aí eles me deram bom dia, mas até então estava sendo ignorado.”

A experiência seguinte foi a de agente de saúde. Ele atuou na área de abrangência da Unidade de Saúde da Família da Bela Vista, bairro onde funciona a Rádio Comunitária Calheta FM. Acompanhando a agente de saúde Amara, ele entrou em diversas casas levando orientações e até palavras de conforto, papel desempenhado diariamente por esses profissionais, mas que em muitos casos nem mesmo as autoridades enxergam.

 

Batata foi lavador de pratos por uma manhã no Restaurante Matuto. Lhe chamou a atenção o fato de duas funcionárias que o conheciam ficarem desnorteadas quando o viram exercendo a função delas. Uma ficou sem voz e a outra com soluço.

“Na cabeça delas (das funcionárias) eu havia ido ali apenas para tirar uma foto. Não, eu não fui só tirar a foto. Eu exerci cada profissão. E foi maravilhoso.”

Por último, Batata voltou a sentar-se na cadeira de cobrador de ônibus, função que exerceu aos 17 anos de idade e na qual a sua mãe, Amara Maria da Conceição de Paula, se aposentou pela Viação São Judas Tadeu. Foi a experiência mais difícil, porque o ônibus rodava o tempo todo e ao final isso deixou tonto.

“Foram todas experiências impactantes. Toda profissão tem a sua importância, e as pessoas precisam acabar com o preconceito em relação a algumas, o que ainda é muito presente”, resume Batata, já pensando no que fazer em seu aniversário de 62 anos.

*José Ambrósio dos Santos é jornalista, escritor e integrante da Academia Cabense de Letras.

Imagens: Luciana Barros, Thomaz Henrique e Maria Estephanie.