Males do mesmo tamanho

Por
Ayrton Maciel*
Em 18.10.2020
Tenho uma compreensão antiga que tem se consolidado ao longo dos anos. Uma interpretação que pode estar equivocada, mas que os fatos – segundo o meu pensamento – não têm me contradito. A corrupção é uma chaga, em qualquer parte do mundo – no Brasil tem sido uma ferida aberta, da colônia ao império e à república -, um mal que, se não cicatriza, consome a própria carne por dentro. O Brasil, para a infelicidade de gerações, não conseguiu superá-la, sequer reduzi-la à certeza da punição.  Enraizada e histórica, é um dos dois grandes males que destroem um país ou, como no nosso caso, obstruem o processo de desenvolvimento econômico e social. Isto é pacífico.
Equiparo o segundo dos dois grandes males, entretanto, como da mesma magnitude para o atraso de uma nação: a ignorância. Corrupção e ignorância têm o mesmo tamanho, o mesmo poder de destruição ou impedimento. Ignorância, aqui, no sentido de ausência de conhecimento, consequência da falta de oferta ou da abdicação da educação, da inexistência ou da insuficiência de escolaridade. Um povo sem a formação básica construtiva – a que contribui para sua capacidade de engendrar consciência, ter poder de discernimento e lucidez no livre-arbítrio – faz tanto mal a si quanto a corrupção. A ele próprio e ao país. E é a educação o maior instrumento de contenção da corrupção.
A lei pune, mas a lei não forma. Sem a escolaridade básica de qualidade, o Brasil sofre. Penam as famílias, penam os Poderes, pena a produção, penam as relações sociais, pena a segurança. A incapacidade do Estado brasileiro de curar essa chaga tem lhe custado caro, talvez muito além do que teria hoje se tivesse vencido a ignorância e a corrupção. O que diferencia uma da outra é que, pela educação, o país poderia ter derrotado a corrupção como mal enraizado. Mas, é preciso reconhecer que essa possibilidade – incluo 520 anos, não perdoando o Brasil colonial – assusta a muitos políticos, governantes e pretendentes. Como um fantasma de libertação de currais, uma ameaça de estouro de boiada.
É impedimento do avanço da educação a convicção de que ela levará ao fim gradual da política como “bom negócio”, boa renda, e a sua vinculada perspectiva de impunidade. Não generalizo. Há os bons no meio dos cobiçosos, no entanto, tamanha à dimensão dos maus, parecem minoria. Sempre há que se lembrar do economista Celso Furtado, de um exemplo contado em suas memórias: “Os maiores adversários da criação da Sudene foram os nordestinos (os políticos)”. Um povo educado, no sentido formal, em nível coletivo de compreensão, discernimento e escolha autônoma, inevitavelmente condenará à morte a corrupção endêmica. E, simultaneamente, eliminará a violência como mecanismo siamês da ignorância.
*Ayrton Maciel é jornalista. Trabalhou no Dario de Pernambuco, Jornal do Commercio e nas rádios Jornal, Olinda e Tamandaré. Ganhador do Prêmio Esso Regional Nordeste de 1991. Escreve aos domingos.
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