Engana-me que eu gosto

Por

Enildo Luiz Gouveia*

Em 05.11.2020

Ao longo da história da humanidade as mentiras, os boatos, as falsidades e mais recentemente as chamadas fake news sempre estiveram presentes. Para derrotar os adversários ou pessoas com as quais a gente “não foi com a cara” apela-se para esta estratégia, num vale-tudo cujo objetivo é vencer o debate ou constranger a outra pessoa.

Tal estratégia tem um espectro diversificado, mas também, em muitos casos, como na política, são utilizadas fórmulas outrora eficientes. É conhecido no Brasil, por exemplo, o medo do comunismo. Na década de 1960, por ocasião do golpe militar, se utilizou o medo do fantasma comunista para justificar a intervenção militar e destituir o governo democraticamente eleito. Em 1989 dizia-se que, se o então candidato Lula fosse eleito, quem tivesse dois carros, um seria tomado pelo governo. O mesmo aconteceria se a pessoa tivesse duas casas. Em 2018 retoma-se este discurso ampliado para o campo religioso (os comunistas, a esquerda são ateus, logo, não podem fazer um bom governo) e moral (ideologia de gênero, ditadura gay) etc. Nas eleições presidenciais dos EUA deste ano este fenômeno também foi verificado. Bernie Sanders que era pré-candidato democrata, não conseguiu a indicação do seu partido muito em função das mentiras espalhadas nos mesmos termos ocorridos no Brasil. O mesmo aconteceu com o candidato democrata Joe Biden, na disputa pela presidência contra o republicano Trump.

Então poderíamos nos perguntar como, diante de tantas fontes de informação, as pessoas ainda continuam acreditando nas fake news?

A sociedade atual é considerada sociedade da informação. Então poderíamos nos perguntar como, diante de tantas fontes de informação, as pessoas ainda continuam acreditando nas fake news? Como ter medo de algo que você nem sabe direito o que é, como no caso do comunismo, do ateísmo, dos direitos da comunidade LGBTQIA+? Acredito que a resposta seja simples e ao mesmo tempo complexa. Simples porque é fácil acreditar em algo quando este algo está de acordo com os meus preconceitos sobre o tema, ou ainda, quando as fake news me ajudam num determinado momento, como no caso da política. Por outro lado, a questão também é complexa, pois, muitas vezes, as fake news, os boatos, as mentiras geram linchamento virtual e presencial e podem levar à morte dos acusados.

Apesar de já termos uma legislação que pune as pessoas que espalham fake news, nota-se neste período eleitoral que esta estratégia, apesar de ilegal, continua sendo adotada com eficiência. Não se tem preocupação em provar nada, apenas acusar e destruir a imagem do outro. Já o acusado tem que lutar para provar sua inocência, numa completa inversão de valores, pois, quem deve apresentar a prova da acusação é quem acusa e não o acusado. Mas, os interesses pessoais se sobrepõem ao compromisso com as informações corretas.

*Enildo Luiz Gouveia é professor do IFPE  e membro da Academia Cabense de Letras – ACL. Escreve às quintas-feiras.

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do blog Falou e Disse.