Crucificação de São Pedro

Por

Jénerson Alves*

Em 13.11.2020

Crocificione di San Pietro é uma das mais conhecidas obras de Caravaggio. Produzida em 1601, encontra-se na Capela de Santa Maria del Popolo, em Roma. No quadro, é possível observar a técnica do chiaroscuro (mistura de luz e sombra) utilizada magistralmente pelo pintor. Com estética barroca, o fusionismo presente na imagem expressa elementos da oposição humano x divino.

Chama a atenção na obra o descomunal esforço envidado pelos algozes do Apóstolo. Apesar de longevo, o peso de S. Pedro é superior à força dos carrascos – dos quais, diga-se de passagem, não são revelados os rostos. Por sua vez, o discípulo do Senhor Jesus apresenta uma face serena, a despeito de estar frente à morte. A tranquilidade expressa na tela difere do caráter impulsivo do jovem Pedro demonstrado nos Evangelhos, aproximando-se da personalidade demonstrada em suas cartas, escritas na velhice do Apóstolo.

Ainda observando o quadro, vemos que o artista retratou a tradição cristã de que Pedro teria morrido crucificado de cabeça para baixo. Segundo os relatos, o Apóstolo não se sentia digno de ter uma morte similar à do Mestre. Supõe-se que Pedro tenha sido crucificado no ano 65, sob a perseguição de Nero.

Na sua segunda epístola, provavelmente redigida no ano 60, Pedro já admoestava aos cristãos da época acerca da proximidade de seu falecimento. “Sabendo que brevemente hei de deixar este meu tabernáculo, como também nosso Senhor Jesus Cristo já mo tem revelado” (II Pedro 1:14). A revelação de Cristo acerca da morte do discípulo deu-se após a ressurreição do Senhor, no momento em que Jesus lhe diz: “Quando já fores velho, estenderás as tuas mãos, e outro te cingirá, e te levará para onde tu não queiras”, conforme está registrado no Evangelho de São João, capítulo 21.

A morte do Apóstolo Pedro revela o testemunho de um homem que se manteve fiel à sua fé. Ele era um rude pescador nascido em Betsaida, na Galileia, que ouviu o chamado de Jesus para ser feito “pescador de homens”. Após soltar os remos e as redes do barco e caminhar com o Carpinteiro, presenciou milagres e maravilhas. Essa experiência fê-lo exclamar a essência da igreja cristã: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus Vivo” (Mt 16:16). Acerca desta confissão, explica-nos o padre Antônio Vieira no Sermão de São Pedro, pregado em Lisboa em 1644:

“Cristo é Filho de Deus, e nós também somos filhos de Deus: Dedit eis potestatem Filios Dei fieri. Em que se distingue logo Cristo de nós? Em que Cristo é Filho de Deus vivo, nós somos filhos de Deus morto. Cristo Filho de Deus vivo, porque Deus, que é imortal, o gerou ab aeterno; nós filhos de Deus morto, porque o mesmo Cristo, morto nos braços da cruz, foi o que nos gerou de novo e nos deu este segundo e mais sublime nascimento”.

*Jénerson Alves é jornalista e membro da Academia Caruaruense de Literatura de Cordel. Escreve às sextas-feiras.