Aprendendo com o processo eleitoral brasileiro
Enildo Luiz Gouveia*
Em 19.11.2020
Confesso que sou favorável a unificação das eleições no país. Tudo bem que daria mais trabalho para os eleitores menos escolarizados se adaptarem, visto que, numa eleição cheia, teríamos oito votos, sendo três para o executivo (federal, estadual e municipal) e cinco para o legislativo (dois senadores, um deputado federal, um estadual e um vereador). Por outro lado, evitaria este círculo vicioso que a cada dois anos praticamente paralisa o país. Também não entendo porque no Brasil, ao contrário do que acontecesse nos EUA (que não são o melhor modelo de democracia existente), as eleições são raramente usadas para realizar plebiscitos e referendos sobre temas de interesses da população, como auditoria da dívida pública, pacto federativo, revisão de algumas leis, entre outras questões. Digo isto porque está comprovado que os parlamentos – sejam eles em nível federal, estadual ou municipal – nem sempre representam os anseios do povo, apesar de serem eleitos por este. Se na democracia o poder emana do povo, ouçamos o que o povo tem a dizer!
Tratando especificamente das eleições municipais, considero que ela seja a mais importante de todas, por se tratar da realidade dos municípios onde as pessoas moram. Todavia, estas eleições parecem que só se tornam importantes nos anos de sua realização. Passado o pleito, pouca gente procura acompanhar o que se discute nas câmaras de vereadores. Exceto quando ocorre um escândalo, a maioria das pessoas nutre certo desprezo por este acompanhamento. Outra questão das eleições municipais refere-se ao seu nível de articulação com os governos do Estado e Federal. Muitas pessoas acham possível reproduzir no âmbito do município o debate que se estabelece nos outros níveis. Contudo, especialmente nas cidades pequenas e médias, isto é uma ilusão. A eleição nestas cidades tende a ser muito mais em função dos parentescos, da gratidão a determinado político que conseguiu o emprego para alguém, ou ainda, que tem ambulância para transportar doentes e, até mesmo, do ‘bom e velho’ assistencialismo na distribuição de cestas básicas, além da compra de votos.
A verticalização ideológica e eleitoral radical não funciona no Brasil.
Há situações em que determinado(a) candidato(a) preza por sua ideologia, mas que para ganhar as eleições municipais, opta ou é obrigado(a) a se candidatar por um partido que representa uma ideologia contrária a sua, mas que, no nível local, lhe dá a estrutura necessária. Casos desta natureza se sucedem e não devem ser analisados com o mesmo viés ideológico que se analisam os pleitos em nível de Estado e Federal, sob o risco de se cometer injustiças. A verticalização ideológica e eleitoral radical não funciona no Brasil. O país é muito grande e diverso e sua democracia é ainda imatura. No nível local/municipal, um político de esquerda, de direita ou de centro, pode não estar disputando por um partido coerente com sua ideologia. Isto é fato!
*Enildo Luiz Gouveia é professor do IFPE e membro da Academia Cabense de Letras – ACL. Escreve às quintas-feiras.
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