Horrores do feminicídio

Por

Carlos Sinésio*

Em 29.12.2020

Contrariando o espírito de paz e fraternidade tão próprio neste período do ano, infelizmente, em muitos lares do Brasil o principal prato servido na ceia desse Natal foi um repugnável crime de feminicídio. Esses horrendos crimes – alguns com requintes de crueldade inimagináveis – aconteceram em diversas regiões Brasil e sem discriminar classes sociais.

Quem acompanha os noticiários pelas TVs ou outros veículos de comunicação pode se deparar com casos e cenários diferentes, mas ao mesmo tempo iguais na sua essência. Isso porque os companheiros ou ex-maridos não aceitavam a separação ou têm crises de ciúmes fora de qualquer controle.

O caso da juíza Viviane Arronenzi, 45 anos, assassinada com dezesseis facadas, no Rio de Janeiro, pelo ex-marido engenheiro, na frente das três filhas deles que ainda são crianças, é de dilacerar qualquer coração.

Assim como o caso do policial que matou a esposa, a cabeleireira Anna Paula dos Santos, de 45 anos, com quem era casado há décadas, com dois tiros, em casa, no Recife, logo após a ceia de Natal.

Outra tragédia de destaque foi o assassinato da jovem Thalia Ferraz, 23 anos, morta pelo ex-companheiro na frente de seus familiares, em Jaraguá do Sul, Santa Catarina. Deficiente auditiva, ela ainda tentou se esconder num quarto, mas um tiro tirou sua vida.

Essas histórias horríveis são exemplos de outras tragédias que se repetiram pelo País, enquanto gente do bem brindava e comemorava, em família, o nascimento de Jesus.

Algo precisa ser feito para barrar esses feminicídios em escala sempre crescente. Criada em 2006 para punir com mais rigor os criminosos e assim diminuir a violência doméstica, a Lei Maria da Penha parece que não está sendo suficiente para diminuir essa criminalidade contra a mulher. Lamentavelmente, os resultados esperados por muitos de nós não estão surgindo.

Os números de feminicídio e de violência contra a mulher vêm crescendo e assustando cada vez mais. Quem fizer uma rápida pesquisa na internet, com algumas consultas no Google, por exemplo, vai constatar que os dados são a cada ano mais assustadores. Em 2020, com a pandemia forçando as pessoas a permanecerem mais tempo em casa, esses dados negativos ganharam mais fôlego.

Somente de março a agosto, foram assassinadas por companheiros ou ex pelo menos 497 mulheres no Brasil. Vale lembrar que essa violência sem limite ocorre nas mais diversas classes sociais.

É inaceitável saber que, nesse mesmo período, uma mulher foi vítima de feminicídio no Brasil a cada nove horas, segundo o monitoramento “Um Vírus e Duas Guerras”, feito por vários veículos de comunicação.

Mesmo pessoas com melhor nível de escolaridade e bem mais informadas também estão se lixando para a legislação e as consequências dos crimes. Assim, matam seres humanos que dizem amar ou ter amado como quem pisa numa barata.

Vários segmentos sociais e instituições têm se manifestado sobre essa criminalidade abominável. Mas isso ainda não tem surtido os resultados que a sociedade precisa para pelo menos se reduzir drasticamente os feminicídios. A lei talvez precise endurecer ainda mais e punir de forma mais rápida e severamente os criminosos.

Algo mais é muito necessário se fazer. Não é possível o País continuar assistindo diariamente mulheres serem mortas pelo simples fato de ser mulheres. Assassinadas cruelmente por não aceitarem mais conviver com homens que um dia lhes fizeram juras de amor, mas que nunca passaram de lobos em pele de cordeiro.

Uma coisa é absolutamente certa: a situação não pode continuar como está. O Brasil precisa descruzar os braços para acabar – ou pelo menos diminuir drasticamente – esse cenário de horror, que tanto nos envergonha e entristece.

*Carlos Sinésio é jornalista com 35 anos de profissão. Trabalhou nos jornais O Globo, Jornal do Commercio e Diario de Pernambuco. Foi assessor de comunicação em diversas instituições públicas e privadas e repórter freelance no jornal O Estado de S. Paulo e na IstoÉ. Atua na TV Alepe. Escreve às terças-feiras.

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do blog Falou e Disse.

Foto destaque:justificando.com