O beijo
Jénerson Alves*
Em 19.02.2021
Observando a tela ‘Il bacio’ (O beijo), do pintor italiano Silvio Allason (1845-1912), é possível afirmar que o artista parece retratar mais do que uma ação. A cena é revestida de uma certa ‘imobilidade’, que sugere a sensação de ‘parar o tempo’, por certo já vivenciada por aqueles que tiveram o coração em chamas.
Oh, quão incandescente pode ser este ato de beijar! Um cientista, conhecedor das coisas do corpo, diria que o toque dos lábios eleva os batimentos cardíacos, estimulando as funções circulatórias e produzindo hormônios como a endorfina, que traz uma sensação de bem-estar. Um poeta, conhecedor das coisas da alma, diria que o beijo é mais do que contato físico: a diferença entre beijo e troca de saliva está no sentimento.
É o coração, e não as papilas gustativas, quem define o sabor de um beijo. É com esta consciência que o eu lírico de Cantares roga: “Beija-me com os beijos de tua boca; porque melhor é o teu amor do que o vinho.” Além do gosto peculiar, o amor possui dimensões próprias, como Drummond bem constatou ao dizer que “o amor é grande e cabe / no breve espaço de beijar”.
Neste mundo pós-moderno, onde tudo é líquido, inclusive o amor, um beijo verdadeiro é capaz de aquecer a alma e indicar o dulcíssimo sabor do verdadeiro amor, o qual é espiritual, responsável e altruísta. É quando beija-se o outro em sua inteireza, amando o passado de trajetórias partilhadas e falhas perdoadas, vivendo o hoje de sentimentos sinceros e assegurando a presença no futuro. Talvez seja isto o que está eternizado no quadro de Allason. Não é que o tempo pare durante o beijo, é que o beijo revela um amor que vive no tempo. Amando a cada dia, ama-se eternamente.
Jénerson Alves é jornalista e membro da Academia Caruaruense de Literatura de Cordel. Escreve às sextas-feiras.
Foto destaque: Reprodução da tela ‘Il bacio’, de Silvio Allason.
Bonito seu texto Jenerson!
O beijo eternizar o tempo! Maravilha!
Muito grato pelo comentário e honrado pela leitura!!
Abração!