Abespinhado e qualificado, este era Arnaldo! 

Por
Rômulo Rossy Leal Carvalho*
Em 27.08.2021
A madrugada musical do Brasil, ao menos a qualificada – com reticência à própria ideia de qualidade – irrompeu tétrica em 27 de agosto de 2020. Um dos expoentes mais ilustres da produção musical deste país seguiu o caminho de todos os mortais.
Com uma postura abespinhada – simpatia nunca foi seu lema – e nem seria, diante da infinidade de poluição sonora que teve que ouvir ao longo da vida, com letras e melodias truncadas pela estupefaciente maneira com que a música – termo oriundo do grego “musiké” – foi tratada em terras tupiniquins. Seu olhar quase sempre exaurido, sua fala grave, mas sua apuração afinada guinaram-lhe a um sucesso memorável, arcabouçado por décadas de dedicação à lisura da produção musical.
Não detinha a perspicácia auditiva de Tim Maia – a quem ajudou a produzir -, mas não negligenciou em encontrar nos talentos que promoveu a magnitude da técnica esparsa em vozes e instrumentos no que tange a artistas consagrados como Rita Lee, Ronnie Von, o já sobrescrito Tim Maia, Fábio Jr., e, por último, a ainda “debutante” da música, Larissa Manoela.
Como jurado, instrumentista, produtor, compositor, destilou seu veneno venial – o que mata é o excesso na dose, nem sempre a substância venenosa. Ele, menos antipático que Décio Piccinini – que, inclusive, nem músico, produtor ou algo dessa natureza é, mas sim jornalista, embora tenha competência para julgar, em parte, alguns cantores -, sabia distinguir aquele que cantava do que não cantava; e ainda do que tentava cantar. Essas ramificações não podem ser deixadas de lado. Existe quem canta, quem tenta cantar e quem, de fato, não canta – categoria em que me incluo.
Arnaldo Saccomani, é de você que estamos nos despedindo com um adeus saudoso, munido da esperança de que, como acreditou que a música transformava vidas – claro, as de quem cantava de fato, a seu ver -, tenha levado consigo a esperança de renascer com o canto do eterno, nos acordes do Além, na afinação dos anjos. Se eles desafinassem/desafinarem, temos certeza, não passariam/passarão desnotados pela sua pronta, abissal, amofinada, aguçada e meticulosa atenção. Até as próximas audições!
*Rômulo Rossy Leal Carvalho é licenciado em História, escritor e membro da Academia de Letras do Vale do Riachão(PI).

Foto destaque: Internet