“É pouco perto do que elas fazem por nós”, diz fundador de ONG que clona árvores antigas para reflorestar o mundo
Guilherme Justino, do Um Só Planeta
Em 02.12.2021
David Milarch criou a Archangel Ancient Tree Archive com o objetivo de replantar a genética de mudas milenares e espalhá-las por florestas para ajudar no combate ao aquecimento global
“Cada vez que entro em uma floresta antiga, tenho a mesma sensação de quando entro em uma catedral. É uma reverência automática.” É com esse misto de fé e conexão com a natureza que o norte-americano David Milarch vê aquilo que considera sua missão: mostrar ao mundo a importância das árvores e agir para espalhá-las pelo mundo.
A organização sem fins lucrativos que fundou, batizada de Archangel Ancient Tree Archive, tem como objetivo pesquisar algumas das árvores mais antigas do mundo e cloná-las usando seu DNA. Com mais de 40 anos de experiência em reflorestamento, Milarch acumula prêmios e distinções nacionais e internacionais pelo seu trabalho, que ele vê como uma espécie de grande biblioteca viva da natureza.
“As árvores são excelentes para sequestrar dióxido de carbono, liberar oxigênio, fornecem uma série de benefícios. Elas são, essencialmente, uma solução para o aquecimento global. Por isso, decidi criar ‘bibliotecas vivas’ da genética de árvores antigas. Elas estão morrendo. Se você tivesse perdido as últimas economias de sua vida, não seria hora de fazer algo?”, questiona ele.
“Você não precisa muito de dinheiro para fazer isso. Você não precisa ter um diploma universitário para fazer isso. Você só precisa ter a disposição de ter uma visão mais inteligente do mundo. É o que eu procuro fazer. E isso ainda é pouco perto do que as árvores fazem por nós”, sacramenta Milarch.
Clonando árvores antigas
David Milarch criou o Archangel Ancient Tree Archive em 1994 para clonar as árvores mais antigas do mundo, principalmente sequoias gigantes. A ONG estuda a genética de árvores para, depois, cloná-las e plantá-las em novos lugares. O objetivo é reflorestar o planeta com árvores que atravessaram ilesas séculos e mais séculos na Terra e, com a força delas, ajudar a combater o aquecimento global.
Ele acredita que, com apoio de governos, empresas, sociedade e diversos laboratórios, seria possível clonar até 5 milhões de árvores em quatro anos – tudo a partir de um pequeno pedaço de uma árvore antiga saudável. As amostras vêm dos ramos superiores, que são então adicionadas a uma solução feita em laboratório que torna possível sua clonagem. “Passamos de uma taxa de sucesso de 3%, no início do nosso aprendizado, para uma taxa de sucesso de 97% usando essa solução”, diz Milarch. “É perfeitamente possível reflorestar grandes partes do mundo com essas espécies majestosas”, garante ele.
Milarch explica que as “melhores” árvores, quando plantadas no ambiente certo, podem elevar a qualidade de todas as outras árvores semelhantes na área. “Essa é a nossa esperança quando uma árvore ‘campeã’ é plantada. Recomendamos que no máximo 10% das árvores ‘campeãs’ sejam usadas em um ambiente de reflorestamento para manter a diversidade genética e permitir que a genética ‘campeã’ se misture com as árvores existentes. Não promovemos monoculturas, mas planejamos o fortalecimento geral das florestas onde nossas árvores são plantadas”, descreve.
O lema da ONG é “a árvore certa no lugar certo, pelo motivo certo”. Entre as soluções para uma série de desafios ambientais, ele cita a absorção de carbono para combater as mudanças climáticas, o controle de erosão, gestão de escoamento, melhoria de bacias hidrográficas e habitat de vida selvagem, entre outras.
Admiração pelas sequoias
O fundador da Archangel Ancient Tree Archive não esconde sua admiração por uma espécie em especial. “Onde quer que vamos, as pessoas amam suas árvores, especialmente as árvores que crescem em sua área. Mas há uma árvore que parece ser mágica de maneira universal, encantando a absolutamente todos que a veem por seu apelo e atração. Todo mundo quer saber sobre as sequoias”, garante ele.
As sequoias são as árvores mais altas do planeta. Eles podem crescer até mais de 115 metros de altura e viver por mais de 2 mil anos. Esses gigantes são encontrados, de maneira natural, apenas em uma faixa que se estende por 700 quilômetros ao longo da costa do norte da Califórnia e do sul do Oregon, nos Estados Unidos – o que, diz Milarch, é parte do problema.
“Restam apenas cerca de 5% das sequoias antigas e ninguém, ninguém clonou nenhuma daquelas grandes árvores antes de cortá-las. Chegamos há alguns anos e dissemos: ‘Ei, escute, não sobrou muito desse material. Por que não tentamos clonar as maiores e mais antigas sequoias do mundo?'”, argumenta.
Por isso, ele explica, o trabalho de propagação das novas árvores ocorre longe, em uma pequena aldeia a mais de 4 mil quilômetros de onde as amostras são coletadas. Um antigo armazém na cidade de Copemish, no Estado do Michigan, localizado no centro-oeste dos Estados Unidos, tornou-se o lar de milhares de sequoias, graças a um processo conhecido como cultura de tecidos: técnica de micropropagação que envolve a exposição do tecido da planta a um regime específico de nutrientes, hormônios e luz em condições estéreis. Os cientistas são capazes de produzir rapidamente milhares de novas plantas, cada uma uma cópia exata da original.
“Eu sei que será difícil para você imaginar, mas estou segurando agora mesmo uma sequoia costeira de mil anos”, disse ele. “Estamos clonando árvores, preservando sua genética, e estamos enviando elas para outros lugares. Assim, começamos a reconstruir a exuberância de florestas antigas no mundo”, celebra.
“Tem algo mais especial do que isso?”, pergunta ele, rindo ao deixar claro que não tem dúvida da resposta.
Foto destaque: Divulgação
Reportagem publicado em Um Só Planeta em 29.11.2021