Gente fina

Por

José Ambrósio dos Santos*

Em 27.06.2024

Como pode vivermos assim, sem enxergar o outro apenas porque o outro cuida da limpeza das ruas que sujamos e poluímos a todo instante, deseducadamente? 

Caminhando ontem pela manhã por ruas do centro do Cabo de Santo Agostinho, uma cena me deixou indignado. Fiquei sem resposta ao cumprimentar com um bom dia e um aceno de mão dois garis que trabalhavam duro para deixar a cidade limpa.

Sim, fiquei indignado!

Entretanto, a minha indignação não decorreu do fato de não ter sido cumprimentado pelos garis, mas sim da constatação de que eles não perceberam o meu cumprimento, até porque, não esperavam ser cumprimentados, acostumados que estão a não serem notados.

Por que é assim?

Pergunto porque sei que não é para ser assim, que não deve ser assim.

A cena me fez recordar uma reportagem que assisti na televisão há uns 20 anos. O repórter ficou intrigado com um afegão de cerca de 40 anos que sequer levantou a cabeça para lhe olhar nos olhos ao ser indagado. O repórter perguntou a razão e a explicação foi chocante: não me lembro exatamente da resposta, mas dizia que vivia de cabeça baixa desde sempre, porque isso era exigido dele naquela parte e época no Afeganistão.

Junho de 2024, centro do Cabo de Santo Agostinho, Região Metropolitana do Recife, Pernambuco, Brasil. Terceira década do Terceiro Milênio.

Como pode vivermos assim, sem enxergar o outro apenas porque o outro cuida da limpeza das ruas que sujamos e poluímos a todo instante, deseducadamente? Chega a ser revoltante os flagras de gente que ‘se acha’ jogando seus lixos a partir das janelas de carrões caríssimos, sujando e desrespeitando gente humilde. E os flagras são constantes.

Na semana passada vi uma imagem no Facebook que retrata bem esse comportamento ‘humano’. São duas fotos: uma delas, um canal que corta uma cidade inteiramente tomado por lixo urbano. A outra, uma harmônica área de floresta.

Quanto precisamos aprender, gente fina.

*José Ambrósio dos Santos é jornalista e integrante da Academia Cabense de Letras.

Imagem: brasildefato.com.br