“Um lugar assustador”: historiador conta por que deixou EUA
Stuart Braun*/DW
Em 11.04.2025
Acadêmico Jason Stanley é um dos críticos de Trump que trocaram a Universidade de Yale pelo Canadá. Ele considera o atual regime dos EUA “fascista”, por desumanizar parte da população e cercear a liberdade de expressão.
“Fascismo é o que a administração Trump está fazendo agora”, afirma o filósofo judeu americano Jason Stanley, referindo-se ao segundo mandato do magnata nova-iorquino. Autor de dois livros aclamados sobre o fascismo no século 20, ele está apto a traçar esse tipo de paralelo.
Em março, Stanley anunciou a decisão de se demitir da Universidade de Yale e mudar-se para o Canadá, onde trabalhará na Munk School of Global Affairs and Public Policy da Universidade de Toronto. Ele segue, assim, os passos do casal de historiadores Timothy Snyder e Marci Shore, que se mudaram para aquela metrópole em seguida às eleições presidenciais americanas.
Quanto à decisão de abandonar Yale, Stanley comenta: “Tenho medo de ser perseguido pelo governo federal.” Referindo-se à vulnerabilidade dos acadêmicos imigrados, sujeitos a serem deportados por se expressar criticamente, acrescenta: “Estou indo embora, porque os meus colegas não podem falar de política nas redes sociais, senão os seus vistos podem ser retirados.”
Política do “nós e eles”
Em seu livro de 2018 How fascism works: The politics of us and them (Como o fascismo funciona: A política do nós e eles), ele descreve como essa forma de regime “desumaniza segmentos da população” para justificar “tratamento desumano, da repressão da liberdade e prisão em massa à expulsão”.
O governo trumpista tem sido acusado de deportar imigrantes à revelia de ordens judiciais, assim como de restringir a liberdade de expressão, ao reter o financiamento a universidades ou repartições federais que promovem a diversidade, igualdade, inclusão (DEI, na sigla em inglês).

Nesse contexto, não se pode mais falar de “populismo”: segundo o historiador, o termo acaba “minimizando [whitewashing] a ameaça”. Como argumentou no livro Erasing history: How fascists rewrite the past to control the future (Apagando a história: Como os fascistas reescrevem o passado para controlar o futuro), de 2024, a intolerância de Donald Trump é fascista por natureza.
Washington tem negado verbas às universidades que foram palco de protestos antibélicos no contexto do conflito Israel-Hamas, argumentando que elas promoviam o antissemitismo. No entanto “os estudantes judeus de Yale eram um dos maiores grupos identitários participando dos acampamentos e dos protestos”.
“Este regime está traçando uma distinção entre bons judeus e maus judeus, e nós conhecemos a história disso”, alerta Stanley. A separação entre judeus de direita, “pró-Israel” e “judeus como eu e meus alunos aqui em Yale, que criticamos as ações de Israel em Gaza” também serve a “um estereótipo antissemita muito perigoso” e falso, “de que nós, judeus americanos, controlamos as instituições”.
Luta pela democracia continua – à distância
Segundo Stanley, a Universidade de Yale recusou-se a ceder às exigências do governo para que investigasse os manifestantes pró-palestinos e “protegeu seus acadêmicos”. Contudo ele está preocupado que, assim como outras, a Universidade de Colúmbia esteja sucumbindo às pressões, tendo prometido uma investigação a fim de evitar cortes bilionários de suas verbas.
“Se você concorda com essas exigências, você não é mais uma universidade”, sentencia o filósofo. “Uma universidade é um local de investigação livre e crítica. E nos Estados Unidos, dada a nossa relação com Israel, é perfeitamente legítimo haver um movimento de protesto exigindo a suspensão do apoio militar a Israel.”
Assim como seus colegas Snyder e Shore, que também se refugiaram em Toronto, ele é frequentemente indagado por que decidiu deixar os EUA em tempos de necessidade. “Bem, de certo modo é mais fácil defender o Canadá do que defender Yale”, responde Stanley.
“Os EUA estão se tornando um lugar assustador, em geral. A Universidade de Toronto pode ser um porto seguro: podemos trazer pesquisadores e jornalistas para lá, a fim de protegê-los melhor do que nos EUA.”
A partir de sua nova posição, ele pretende cultivar um ambiente acadêmico mais inclusivo: a Monk School planeja criar “o principal centro do mundo em defesa da democracia”, e receberá jornalistas tanto de países democráticos quanto autoritários, como a Rússia e os EUA.
Além disso, Jason Stanley quer defender seus filhos, que são judeus e judeus negros, pois para ele os ataques contra a DEI e a história negra “são um ataque contra a gente negra”, e “quero que meus filhos cresçam em condições de liberdade”.
Marci Shore e seu marido, Timothy Snyder, estudaram os regimes fascistas no Leste Europeu, e através dessa lente também conseguem tratar paralelos com a administração Trump.
Sobre sua decisão de deixar os EUA, Shore contou ao jornal ucraniano The Kyiv Independent: “Eu podia sentir o reino do terror entrando em espiral. Meu impulso foi pegar meus filhos e sair de uma situação que me parecia muito escura e muito assustadora.”
Jason Stanley assegura que, apesar da mudança, ele não está abandonando a luta em casa: “Vou lutar pela democracia americana onde quer que eu esteja.”
Imagem destaque: Protesto na Universidade de Colúmbia: pró-palestinos e pró-Israel se confrontam. Para governo Trump, só um dos lados tem razãoFoto: Aya Ibrahim/DW