Os sinais que vêm do céu
Ayrton Maciel*
Em 06.09.2020
“Irmãos, não há glória sem dor. Não há querer sem ofertar. Não há retorno sem entrega. Não há promessa sem dádiva. Quem doa, cede ao Pai. A prosperidade é uma estrada com retorno. Se é o que tens, doa; o dinheiro, a casa, o carro, eles retornarão. É a promessa. Oh, glória! Deus é fiel. ‘Acaso promete e deixa de cumprir’? Doa, pede, e receberás. Irmão, abra o coração. A tua mão será o teu tesouro. Aleluia!”. Eis a pregação moderna: os fins justificam a palavra. Um mundo globalizado exige objetividade, praticidade, clareza e metas.
A pregação do pastor Pontes Walls traduz a doutrinação das igrejas neopentecostais abertas em escala, no País, em 50 anos. Umas prosperaram, indo da matriz a filiais multinacionais; outras multiplicaram-se em redes pátrias. Nenhuma que tenha se planejado e cobrado resultado quebrou, ao que se sabe. A fé tem movido montanhas e negócios. Pontes Walls é ficção, mas a sua doutrina alimenta prosperidade. Seu sermão, como inspiração, pode impulsionar aquele com dom profético e oratória persuasiva a ter sua Igreja. A fé é também um negócio.
A mim, por que não? A você, por que não? A fé é fundamental, mas não precisa ser hegemônica para abrir uma igreja. Sem doutrina e planejamento não prosperará. E doutrina que não vise prosperidade não se conserva, nos tempos atuais. Doar antes de pedir é o conceito geral da fé. A prosperidade é o espírito da doutrina. Por esses princípios, proféticos progrediram e igrejas proliferaram em cinco décadas. A fé remove muros, constrói elos, ergue pontes e move montanhas de obstáculos para servir a governos e progredir negócios.
Mas, hão de perguntar: e a Igreja Católica não comete pecados? Sim, tem seus pecadores, sues embusteiros. Em 2.000 anos de história, os ensinamentos foram violados com frequência: a Inquisição, o comércio das indulgências, a escravidão, papas adúlteros e assassinos, a vista grossa de bispos alemães e a suposta conivência de Pio XII com Hitler e o nazismo, a cumplicidade com Mussolini e o fascismo, os escândalos dos abusos sexuais de crianças. Os erros são história, não foram esquecidos.
A Igreja Católica é história: erguida a partir do apóstolo Pedro, testemunha da existência material de Jesus, preserva seus dogmas. Após 2.000 anos, tem reconhecido seus grandes erros. Porém, feita por homens, não impede padres comerciantes. Igrejas protestantes também estão consolidadas, algumas com 500 anos: Luterana, Batista, Presbiteriana, Anglicana e Metodista. E até as Pentecostais – com um século de nascimento -, que creem na cura pela fé. Mas, como o tempo deprecia a matéria e o espírito, a fé pode ser aviltada. Aí, a fé não só cura, como faz negócios. Assim, a questão é o comércio da fé.
Flordelis é só um enredo mal feito.
Nesse contexto vieram as neopentecostais, a partir dos anos 1970. Os valores espirituais são depreciados, o comércio predomina sobre a fé – e progride pela fé – e as igrejas prosperam em rede. A promessa da cura, a promessa da riqueza material e a promessa da superação são a prosperidade de seus pastores. A virtude dos Macedo, Valdomiro, R.R., Hernandes, Anderson e Flordelis está no sucesso comercial da fé. Em comum, a mídia para a pregação, cultos espetaculosos, exorcismos e a cura. No ritmo dessa prosperidade correm o de se corromper e o de matar. Flordelis é só um enredo mal feito.
*Ayrton Maciel é jornalista. Trabalhou no Dario de Pernambuco, Jornal do Commercio e nas rádios Jornal, Olinda e Tamandaré. Escreve aos domingos.
Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do blog Falou e Disse.