O SEBÁstianismo

Por

Jénerson Alves*

Em 25.09.2020

Todos conhecemos o mito lusitano do sebastianismo. Nossos irmãos d’além-mar acreditam que Dom Sebastião voltará para restaurar a glória de Portugal. Peço vênia para, com licença poética, propor uma outra linha interpretativa: e se, ao invés de retornar em um cavalo branco, como reza a lenda, o líder já tenha vindo, mas em uma nação e com um propósito diferente? E se o mítico rei já tiver voltado, em outro país, não para mudar uma ordem política, mas para estabelecer um reino de imaginação e encanto? Seguindo essa nova interpretação, um forte ‘candidato’ a Dom Sebastião é o multiartista Sebastião Alves Cordeiro Filho, o nosso Mestre Sebá. As semelhanças entre os dois não se limitam ao nome. Sebá nasceu em 20 de janeiro de 1957, logo, é do signo de aquário – o mesmo do rei português, como nos informa o astrólogo João Medeiros.

Ora, se Dom Sebastião é uma representação metonímica de Portugal, Sebá é a representação antropomórfica da Arte – ícone máximo de um reino muito mais digno do que qualquer designação geopolítica na história da humanidade. Atuando como mamulengueiro, ator e radialista, Sebá fez do País de Caruaru a sede do seu trono. Seu poder é exercido através das mãos meigas que constroem cenários de sonhos, luzes e formas. Uma garagem se torna um teatro e bonecos de madeira e pano ganham vida, fazendo fulgurar os olhos de crianças e adultos.

De uma família simples e humilde, Sebá começou a trabalhar ainda criança: com oito anos de idade. A partir do contato com o cinema, decidiu o queria ser durante a vida: artista. Perseguindo seu sonho, mudou-se de Sertânia, sua terra natal, para Caruaru. A Princesa do Agreste, como de costume, acolheu-o como filho. Apenas aqueles que não conhecem a essência do caruaruense têm aversão a quem vem de fora para viver na Terra de Vitalino. Foi neste chão que se inspirou e tornou-se inspiração na cena cultural.

Sua vida tornou-se peça de teatro, intitulada ‘Olha pro céu, meu amor’, escrita pela pena inspirada de Vital Santos. O espetáculo percorreu palcos de teatros prestigiados em todo o país. Nos anos 1980, ao integrar o elenco de ‘A noite dos tambores silenciosos’, descobriu o teatro de mamulengos e passou a se dedicar de corpo e alma para essa manifestação artística. Em 2020, completa 35 anos de dedicação ao mamulengo.

Sebá também fez incursões pelo cinema, participando de filmes como ‘A história da eternidade’, de Camilo Cavalcante; e ‘Amarelo Manga’, de Cláudio Assis. Na TV, atuou na novela global ‘Velho Chico’. No teatro, participou de espetáculos como a Paixão de Cristo de Nova Jerusalém e de ‘O Auto das 07 Luas de Barro’. Apresenta um programa de rádio em Caruaru e, principalmente, é sinônimo das mais autênticas expressões culturais do nosso povo. Ator que não precisou de aula, Sebá entende que “o teatro é a vida” (como costuma falar). Além da técnica, o seu ser exala arte. O brilho dos seus olhos reflete o encantamento com a existência – talvez por isso conseguiu vencer o câncer e outras doenças.

Há alguns dias, Sebá recebeu o prêmio de melhor ator, na Mostra Agreste da sétima edição do Festival de Cinema de Caruaru, pela sua atuação no filme ‘Sebá – Faces das Artes’. Com roteiro e direção de Robson Santos, o curta é uma proeminente expressão artística. Além de trazer informações, faz sorrir, chorar e pensar. A Arte depõe acerca de seu filho! Disponível no YouTube, o filme é, quiçá, um anúncio profético da chegada de Dom Sebá, monarca fundante de um futuro melhor, de uma terra formada por sonhos e gargalhadas infantis.

Confira o filme no seguinte link:

*Jénerson Alves é jornalista e membro da Academia Caruaruense de Literatura de Cordel. Escreve às sextas-feiras.

Foto destaque: Cecília Morais/G1 Caruaru.