Por que os bons partem cedo?

Por
Ayrton Maciel*
Em 27.09.2020
Esta é uma pergunta sem resposta. Desde criança, escutamos os lamentos pela partida precoce de alguém, por se tratar de uma boa pessoa. Um parente, um amigo de infância, uma vizinha, um idoso prestativo, gente que na vida fez o bem, doou-se, praticou a caridade, por ser cristã ou por ser da sua índole. “Mas, por que ela? Por que ele? Tanta gente ruim por aí, neste mundo, e Deus leva logo uma pessoa boa”. São questionamentos comuns em momentos de perda. E por que é assim? Por que os maus ficam? Os paradoxos instigam e são inspirações para a vida.
Tantos perversos, desumanos, insensíveis, e os bons furam a fila. Os maus vivem mais? Penso que não é assim. Os bons morrem no tempo certo, e os maus também morrem no tempo certo. Não há aqui concordância com dogmas espíritas: as pessoas nascem com “a data certa da partida” e cada pessoa é a “reencarnação de vidas passadas”. Seria uma injustiça com Deus dizer que Ele chama alguém em seu melhor momento; seria uma injustiça divina a reencarnação de alguém para pagar por erros de vidas anteriores. Se assim fosse, teríamos a mesma população na Terra desde o Big Bang, a Grande Explosão.
Se desacredito na predestinação – nascer com data, hora e causa da morte – e na reencarnação para pagar dívidas passadas, acredito mesmo é que não há momento certo para os bons morrerem, nem para os maus partirem (embora preferencialmente ocupem o começo da fila). Não há distinção entre bons e maus. A genética e a fatalidade (não no sentido do destino escrito, mas do imponderável) são os considerandos para o fim. Assim, bons e maus morrem no tempo certo (não no sentido espírita da data definida). Ninguém vai antes ou depois, vai no tempo certo.
A Deus, o privilégio da liberdade. Benefício concedido ao mortal. Se aceito como infinito, criador e força, Deus nos deu o livre-arbítrio. Um dom, sim, capaz de influenciar no limite da vida, seja pela genética, seja pela fatalidade. Não cabe, então, criticar a Deus pelos bons que vão cedo, nem cobrar pelos maus que ficam. O que se pode concluir com os lamentos e indignações é que são consequências das diferenças: o que diferencia (os homens) é o que cada um planta, e cada um terá a medida exata do que colheu. Os bons deixarão tristeza, os maus… indignação, revolta. Assim é, respeitado o direito do outro crer, duvidar e contrariar.
Assim é se me parece. Nada está escrito. Acho que Deus é um democrata. Quem doou, exercitou a caridade, pregou a justiça, partilhou, respeitou direitos e inspirou iguais, por esses e outros bons gestos deixa lamentos na morte. Um justo reconhecimento de quem fica e segue. De outro lado, quem atuou às avessas, esses geram indignação na permanência. Um legítimo protesto de quem optou pelo bem.
Ayrton Maciel é jornalista. Trabalhou no Dario de Pernambuco, Jornal do Commercio e nas rádios Jornal, Olinda e Tamandaré. Escreve aos domingos.
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