A ilusão do conto de fadas

Por

Valéria Saraiva*

Em 26.10.2020

As pessoas fantasiam muito a questão do casamento. A culpa disso são os contos de fadas. Eles dão uma ilusão de que tem um príncipe encantado que vai aparecer e resolver todos os seus problemas. O homem perfeito. Só que é só uma fantasia. Já perceberam que o conto de fadas acaba depois do casamento? Ninguém conta o que acontece depois. Só a celebre frase: E todos viveram felizes para sempre. Só que casamento não é assim. Não se é feliz o tempo todo. Sempre existem conflitos, tem altos e baixos. Como é normal em qualquer relação. São duas pessoas com cabeças diferentes. Como disse Michael Derick: “Cada cabeça é um mundo e em cada mundo vivem seres diferentes.” Ou seja, são pessoas com vivências diferentes de mundo, talvez algumas afinidades, mas quando essas divergências entram em choque, vêm as brigas. Muitas mulheres e até homens não estão preparados para casar, porque não têm a menor ideia do que seja um casamento de verdade. Um cuidar do outro, respeito, tolerância, renúncia, amizade e amor. Durante o namoro só se veem arrumados. Não tem que lavar roupa, arrumar a casa, fazer comida. Saem pra comer fora, vão ao cinema, à praia, são só ‘flores’. Depois que se casam muitos homens acham que a função de cuidar da casa e da comida é da mulher. E muitas se submetem pra não gerar conflitos. Mas isso vai se tornando uma sobrecarga muito grande. Principalmente quando elas trabalham fora e tem que cumprir uma segunda jornada em casa quando voltam do trabalho. É aqui que acaba a ilusão do conto de fadas. E você percebe que seu príncipe encantado não existe. É só alguém igual a você com defeitos e qualidades. E para o casamento não desmoronar você tem que conversar e entender que a casa é dos dois, então o trabalho também é dos dois, ou seja, tem que dividir as tarefas.

Todo casamento tem dificuldades, brigas, falta de entendimento. Mas tudo tem um limite. Quando chega num ponto em que compromete sua autoestima, está na hora de reavaliar a relação.

Relações saldáveis fortalecem a gente e relações doentias ou de exploração sugam a nossa energia. Às vezes é melhor pular de um barco do que  continuar a navegar em direção a um penhasco. O casamento é bom quando os dois são felizes e procuram a felicidade mútua e não só satisfazer a própria felicidade. Embora eu tenha que ser uma pessoa feliz pra conseguir fazer outra pessoa feliz, tenho que ter amor próprio. Fazer o outro feliz é a chave da felicidade. Como ensina a oração de São Francisco: “Pois, é dando que se recebe, é perdoando que se é perdoado e é morrendo que se vive para a vida eterna.”

*Valéria Saraiva é enfermeira, poetisa, cronista, autora do livro “Lírios, Tulipas e escorpiões” e membro da Academia Cabense de Letras. Escreve às segundas-feiras.