Para que serve a poesia?
Jénerson Alves*
Em 30.10.2020
Em um mundo cada vez mais utilitarista como o nosso, não raramente as pessoas se questionam sobre a necessidade de fazer (ou ler) poesia. Para pensar um pouco neste tema, precisamos refletir sobre a gênese da linguagem. O catedrático Don Raimundo Miguel já inferia que a linguagem que nossos primeiros pais aprenderam do Senhor Deus deveria ter o objetivo de tão somente atender a questões do contexto imediato, acomodada a circunstâncias. O aperfeiçoamento do uso do idioma viria apenas posteriormente, por meio das artes e das ciências.
Portanto, a estética é uma das funções mais significativas do texto literário. Nele, o que se verifica não é sua semelhança com o real, mas a interpretação que dele se faz. William Blake sabia disso e afirmou: “A árvore que o sábio vê não é a mesma árvore que o tolo vê”.
Mas uma mulher que vivia perto da minha casa decretou a morte de um ipê que florescia à frente de sua casa porque ele sujava o chão, dava muito trabalho para a sua vassoura. Seus olhos não viam a beleza. Só viam o lixo”.
Rubem Alves pontua esse conceito, nos introduzindo ao âmago da construção de obras literárias, quando diz que a percepção ocular é distinta nos seres. “Ver é muito complicado. (…) Sei disso por experiência própria. Quando vejo os ipês floridos, sinto-me como Moisés diante da sarça ardente: ali está uma epifania do sagrado. Mas uma mulher que vivia perto da minha casa decretou a morte de um ipê que florescia à frente de sua casa porque ele sujava o chão, dava muito trabalho para a sua vassoura. Seus olhos não viam a beleza. Só viam o lixo”.
A plurissignificação é característica básica, que se relaciona com a estética. Ora, se um texto não foi escrito em sua função utilitária (preocupada em informar), abre-se a possibilidade de múltiplas interpretações e pode provocar os mais diversos sentimentos no leitor, em uma subjetividade que ratifica a definição do poeta moderno norte-americano Ezra Pound, que “literatura é a linguagem carregada de significado. Grande literatura é simplesmente linguagem carregada de significado até o máximo grau possível”.
Outra característica intrínseca à Literatura é a documentação do imaginário, da ficcionalidade, ou seja, a simulação, o fingimento, a fantasia.
Em outras palavras, a poesia toca no belo, gerando sentimentos agradáveis aos nossos sentidos, e no sublime, comovendo nosso espírito.
A função da poesia é alimentar nossa alma. Afinal de contas, “nem só de pão viverá o homem”.
*Jénerson Alves é jornalista e membro da Academia Caruaruense de Literatura de Cordel. Escreve às sextas-feiras.
Foto destaque; A leitora, óleo sobre tela de Renoir, 1875.
A velha arte de Homero e Virgílio continua mexendo com o imaginário popular, principalmente nestes tempos de pandemia e de isolamento social. Para o professor e crítico literário Carlos Felipe Moisés, “a poesia serve ou serviria para ensinar a ver como se víssemos pela primeira vez”. Insubmissão, liberdade e transgressão são alguns dos mais variados predicados que esse gênero comporta. Objeto de regozijo para alguns, alimento da alma para outros, a poesia continua arrastando o seu caudaloso rastro, subvertendo permanentemente o já visto.
Muito agradecido pela leitura e pelo comentário, amigo. Forte abraço!
A poesia e seu poder de encantar e alimentar nossa alma e existência. O texto de Jénerson nos traz o encantamento da arte poética. Parabéns pela linguagem e temática abordadas!!!
Muito grato pela leitura. Bom saber que você gostou! Abraço!
Qual é a utilidade da poesia? Segundo o poeta polonês Zygmunt Krasiński [1812-1859] :
« A poesia é a única coisa que pode motivar as pessoas a agir. Não estou falando aqui de poemas, mas do que há de poético em nossa alma, do que pode ser manifestado e visto no brilho de um sabre, ou ouvido em uma estrofe! »