Amizade em tempos de pandemia

Valéria Saraiva*

Em 02.11.2020

A amizade é uma coisa estranha. E nesses tempos de pandemia a impressão que eu tenho às vezes é de não ter amigos.  Só amigos virtuais. Fisicamente eles não estão presentes. Talvez porque, tanto eu quanto eles, estamos com medo dessa pandemia.

Ninguém saí de casa, ninguém visita ninguém, ninguém marca nada. Só um bom dia ou boa noite nas redes sociais.

É tão entediante essa quarentena. Minha criatividade já acabou. Agora só leio livros. Mas não tão rápido como gostaria. No momento estou lendo O fio da navalha, do escritor W. Somerset Maugham. É um excelente livro. Mas estou me arrastando com a leitura dele. Foi um amigo que me indicou. Dependendo do livro, consigo ler um capitulo por dia, ou até mais de um.

Acho tão estranho o costume das pessoas daqui do Recife que dizem “a gente se vê.” Quando na verdade querem dizer talvez a gente se veja por acaso, por aí.

Tenho várias amigas que dizem que querem tomar um café comigo. E fica nisso: – Vamos marcar?  – Vamos ver um dia? E esse dia nunca chega.

Antigamente, quando eu era criança, não sei se porque fui criada no interior e tenho uma criação diferente dos meus amigos, quando alguém marcava uma coisa, marcava mesmo. Não tinha essa nuvem de dúvidas pairando no ar.  Vamos ver. Vamos ver o quê? É sim ou não!

Eu até entendo algumas pessoas.  Por causa da pandemia, estão evitando sair de casa. Mas antes dessa doença surgir as coisas já eram assim. Não é de agora. Por isso tenho tantas dúvidas.

Eu ainda estou aqui. Cadê vocês?

Como disse o filósofo britânico Francis Bacon, “Não há solidão mais triste do que a do homem sem amizades. A falta de amigos faz com que o mundo pareça um deserto.”

Espero que esteja enganada, porque tem alguns amigos de quem gosto muito. Que quando nos falamos tenho a impressão de que o tempo não passou. Mas a maioria dos meus amigos se afastou. Só converso com eles pelas redes sociais e por pouco tempo. Acho que não vejo alguns amigos há meses, alguns há anos. Eu ainda estou aqui. Cadê vocês?

*Valéria Saraiva é enfermeira, poetisa, cronista, autora do livro “Lírios, Tulipas e escorpiões” e membro da Academia Cabense de Letras. Escreve às segundas-feiras.