Começou 2021?

Por

Enildo Luiz Gouveia*

Em 21.01.2021

Para nós brasileiros, particularmente os nordestinos, pernambucanos, todo ano se inicia após o carnaval. Só após a festa começa a labuta, as aulas, a vida volta ao normal. Mas, se neste “novo ano” não vai haver carnaval, estaríamos presos no ano anterior, em 2020? Digo que sim, considerando a pandemia, os engasgos políticos, econômicos, o racismo, o feminicídio e outras mazelas que nos afligem.

Um novo ano deveria começar com a expectativa de algo novo em nossas vidas. Da superação das dificuldades e da esperança em dias melhores. Todavia, no Brasil, 2021 parece saudoso de 2020. Uma frase atribuída a Carl Sagan e que circula nas redes sociais diz “Não é possível convencer um fanático de coisa alguma, pois suas crenças não se baseiam em evidências; baseiam-se numa profunda necessidade de acreditar” cai absolutamente perfeita para a atual situação do país.

Se por um lado, na imensa maioria dos países os governantes celebraram a chegada das vacinas contra a pandemia da COVID 19, no Brasil, o presidente sequer comemorou tal feito, pois, pra ele e para seus seguidores, aplica-se a frase de Carl Sagan, e o que escrevi no artigo Engana-me que eu gosto, em novembro de 2020. Negam-se as evidências científicas em nome de frases de efeito desconexas, inverídicas e preconceituosas. Prefere-se continuar na contramão da própria medicina, recomendando tratamentos inúteis e medicamentos sem efeito para a COVID 19. Noutro fronte, explora-se politicamente a incompetência do governo associada à falta de interesse em solucionar a questão. Joga-se a culpa em todo mundo mediante o arsenal de fake news. Sim, 2021 começa sob o efeito deste crime. O que é mais estranho é a capilaridade com que as mentiras chegam às pessoas. Impressiona a quantidade de líderes religiosos – em sua maioria pastores (neo)pentecostais – que fazem campanha negacionista sobre as vacinas. A ciência, quem diria, em pleno século 21, ainda precisa convencer um rebanho que teima em duvidar dos seus feitos, baseado apenas em crenças sem qualquer referência empírica.

Acredito que no atual contexto, um novo ano só começará após a vacinação e imunização em massa da população. Só começará quando a ignorância for suplantada pela evidência científica. Quando a educação for mais importante que as redes sociais. O carnaval pode esperar, a vida não! Como diz um trecho da música de Belchior e que foi amplamente difundida na virada do ano: “Ano passado eu morri, mas este ano eu não morro!” (Sujeito de Sorte, Belchior).  Feliz 2021 ou infeliz 2020 (persistente)!

*Enildo Luiz Gouveia é professor do IFPE e membro da Academia Cabense de Letras – ACL

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