Políticas públicas (parte 1)

Por

Fernando Silva*

Em 14.11.2020

As políticas públicas fazem parte do sentido existencial do Estado nas três esferas da República Federativa do Brasil e devem ter centralidade na atuação do Poder Público (Executivo, Legislativo, Judiciário, Ministério Público e da Defensoria Pública). Elas, as políticas públicas, têm relação direta com a qualidade de vida (ou ausência) de cada pessoa moradora da cidade e do meio rural. Mas, o que são políticas públicas do ponto de vista jurídico e das construções teóricas? As políticas públicas são o mesmo que políticas sociais? Quem mais tem responsabilidades com a elaboração, aprovação e a efetivação das políticas públicas?

Neste e nos próximos artigos serão apresentadas, sinteticamente, definições jurídicas e construções teóricas sobre políticas sociais. Cabe assinalar que por limitações editoriais, cada artigo terá no máximo duas páginas e o que será apresentado guarda relação com a trajetória política e profissional e das leituras e estudos empreendidos. A ideia central é apresentar diferentes definições e compreensões que permitam alimentar debates e, principalmente, a incidência política.

A Constituição Federal (CF, 1988) tem distintas definições sobre políticas públicas e sobre às responsabilidades de suas formulações, deliberações e execução. Inicialmente, cabe assinalar que o Art. 216-A determina que o Sistema Nacional de Cultura será “organizado em regime de colaboração, de forma descentralizada e participativa, institui um processo de gestão e promoção conjunta de políticas públicas de cultura, democráticas e permanentes, pactuadas entre os entes da Federação e a sociedade, tendo por objetivo promover o desenvolvimento humano, social e econômico com pleno exercício dos direitos culturais.” As ideias centrais são de que as políticas públicas de cultura devem ser materializadas de forma descentralizadas, participativas, democráticas e permanentes e, necessariamente, pactuadas entre os entes federativos e a sociedade, tendo por objetivos o desenvolvimento humano, social e econômico.

O Art. 227 da CF determina que “o Plano Nacional de Juventude, de duração decenal, visando à articulação das várias esferas do poder público para a execução de políticas públicas.” Importa assinalar que a definição tem relevância por indicar que o plano deverá ter duração decenal, o que demonstra a pretensão do Congresso Nacional de que as políticas públicas para a juventude não ficam restritas à duração de um mandato do Poder Executivo e Legislativo, que é de 04 anos.

Quando aborda o direito à saúde o Art. 196 da CF é taxativo ao afirmar que “saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.” Três comentários são essenciais quanto ao direito à saúde. É direito de todas as pessoas e dever do Estado, será ofertado para a promoção, proteção e a recuperação e traz uma definição diferenciada, sendo efetivado através de políticas sociais e econômicas.

E focando no direito à assistência social o Art. 204 da CF define que as ações governamentais serão realizadas com recursos do orçamento da seguridade social e deverão ser assegurados com a “descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas às esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência social”. O referido direito precisa de recursos do orçamento público, a descentralização político-administrativa e definir distintas responsabilidades entre os entes federados e a participação de entidades na sua execução. O mesmo artigo estabelece que é indispensável a “participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis.”

A CF contém outra importante definição ao abordar os direitos das crianças e dos adolescentes, que estão elencados no Art. 227 da CF, quando no inciso § 7º define que “no atendimento dos direitos da criança e do adolescente levar-se-á em consideração o disposto no art. 204.”

Pelo exposto e comentado brevemente fica evidenciado que a CF de 1988 é herdeira do processo de redemocratização da Sociedade e do Estado e afirma que as políticas públicas devem trilhar os caminhos democráticos da participação na formulação e no controle com a descentralização político-administrativa. Contém definições genéricas e diferenciadas, a exemplo das políticas públicas de saúde, que passam por políticas sociais e econômicas e da seguridade social:

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios …”.

A responsabilidade do Estado é consagrada em diversos outros artigos, a exemplo da Segurança Pública (Art. 144), Educação (Art. 205), Esportes (Art. 271), Desenvolvimento Científico (Art. 218) e os Direitos Culturais (Art. 215).

Por fim, o orçamento público tem centralidade para a formulação, aprovação e execução das políticas públicas e merece destaque em cinco artigos da CF/1988 (Arts. 165 – 169), que se destinam ao Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretriz Orçamentária (LDO) e Lei Orçamentária Anual (LOA), constituindo-se num ciclo orçamentário. A responsabilidade de coordenar a elaboração, de forma participativa, de cada peça orçamentária, é do Poder Executivo (Federal, Estadual, Distrito Federal e Municipal).

O PPA é sempre elaborado no primeiro ano do mandato do chefe do Executivo e aprovado pelo Poder Legislativo (Congresso Nacional, Assembleia Legislativa e Câmara Municipal) e tem validade para os quatro anos subsequentes da administração pública. A título ilustrativo, no próximo ano serão elaborados e aprovados o PPA de cada município brasileiro que terá validade para os anos de 2022, 2023, 2024 e 2025. Geralmente, o PPA é revisado, anualmente, porém, o momento central da incidência política (definir as diretrizes, objetivos e metas) é no momento da elaboração do PPA. O período de elaboração e aprovação da LDO e da LOA é anual. Sinteticamente, a primeira, com as metas e prioridades, e a segunda contemplará o orçamento fiscal. É uma síntese do ciclo orçamentário brasileiro e para uma melhor compreensão recomenda-se, inicialmente, a leitura dos artigos acima indicados e conhecer o definido em cada Constituição Estadual e na respectiva Lei Orgânica de cada município. Nelas serão encontrados, geralmente, os prazos e procedimentos que são indispensáveis ao necessário jogo político das disputas inerentes à democratização da gestão pública.

Para a formulação, deliberação e execução (com a devida destinação de orçamento público) de políticas públicas é essencial ter presente as especificidades quanto ao direito à cidade, ao meio ambiente, a morar no campo, à assistência social, educação, saúde, cultura, ao lazer, esporte, a brincar, à leitura, segurança pública, habitação, ao saneamento e todos os direitos direcionados às crianças e aos adolescentes, às juventudes, mulheres, aos indígenas, quilombolas, ribeirinhos e às pessoas idosas, com deficiências, negras e LGBTQI+.

O sentido do Estado Democrático de Direito é a efetivação dos direitos fundamentais das pessoas e as políticas públicas (sociais e econômicas) devem sempre ter presente que “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”, em atenção ao parágrafo único do Art. 1º da Constituição Federal de 1988. Aguardem os próximos artigos.

*Fernando Silva é mestrando em Educação, Culturas e Identidades. Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE)/Fundação Joaquim Nabuco (FUNDAJ) e integrante do Centro de Cultura Luiz Freire (CCLF), Olinda – PE. Escreve quinzenalmente, aos sábados.jfnando.silva@gmail.com

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