MPF quer a Funai e a Conab distribuindo cestas básicas a indígenas no Pará

Por

Redação, com Secom MPF

Em 14.06.2020

Aldeias devem receber alimentos enquanto durar epidemia covid-19 – Foto: Ascom/MP

Para prevenir o risco de disseminação do novo coronavírus dentro de terras indígenas do Pará, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou duas ações civis públicas, em Belém e Santarém, para obrigar a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) a fornecerem cestas básicas e material de higiene enquanto durar a pandemia. O pedido havia sido feito antes, por meio de recomendações do MPF, mas apesar de reconhecer a necessidade, os órgãos do governo federal não entregaram, até hoje, os alimentos e kits de higiene suficientes para atender a todas as comunidades.

A ação judicial iniciada em Belém pretende garantir a segurança alimentar e sanitária de povos indígenas nas regiões do Sudeste e Nordeste do Pará, além do povo Kayapó no Sul do estado. No processo iniciado em Santarém, povos das regiões do Tapajós, Trombetas, baixo Amazonas e baixo Tocantins devem ser atendidos. A demora na entrega das cestas pode ser uma das causas para a contaminação em comunidades indígenas. Sem acesso seguro aos alimentos nas aldeias, muitos indígenas tiveram que se deslocar para as cidades para acessar benefícios sociais e adquirir mantimentos, o que pode ter provocado a contaminação pela covid-19. Nas regiões citadas nos processos do MPF, foram registradas mortes pela doença entre os povos Borari, Xikrin, Kayapó, Assurini, Gavião, Aikewara e Tupinambá. Todos os outros seguem ameaçados de contágio, pela situação de insegurança alimentar.

O risco de disseminação em razão de deslocamentos de indígenas para as cidades era bem conhecido de todos os órgãos que atuam na região. Em 2 de abril, o MPF emitiu recomendação à Secretaria Especial de Saúde Indígena e à Funai para que tomassem medidas em todo o país para evitar esses deslocamentos e prevenir os contágios. Os dois órgãos reconheceram os riscos em respostas oficiais ao MPF. A Sesai elaborou um plano em que recomendava aos indígenas que não se deslocassem para os centros urbanos, dada a “reconhecida vulnerabilidade das populações indígenas às doenças respiratórias”. São comuns na história dos povos indígenas os genocídios provocados por epidemias de enfermidades que atacam o sistema respiratório.

A Funai também reconheceu a importância de manter os indígenas nos territórios para evitar a disseminação da covid-19, mas se recusou, em documentos oficiais enviados ao MPF, a adquirir alimentos para as comunidades, alegando não ter obrigação de garantir a segurança alimentar dos povos indígenas. Os procuradores da República que ajuizaram ação em Belém refutam o argumento. “O que a Funai pretende é um dispositivo legal expresso determinando ‘em caso de insegurança alimentar ocasionada por uma pandemia deve a autarquia distribuir cestas básicas e kits de higiene aos povos indígenas’. Ora, por evidente que tal preceptivo dificilmente existirá, porque a lei não é capaz de prever em detalhes todas as situações do mundo fenomênico, entretanto, tal obrigação surge do próprio ordenamento jurídico, que determina ser a União obrigada a garantir a segurança alimentar e a saúde dos povos indígenas e que é a Funai o ente responsável por representar a União na promoção dos direitos sociais”, dizem.

Apesar da recusa formal em comprar os alimentos, a Funai apontou a Conab como responsável pelas aquisições e se comprometeu a apoiar a distribuição. Desde abril as comunidades aguardam as cestas básicas e os kits de higiene. Em algumas coordenações da Sesai, foram tomadas providências de emergência para adquirir materiais e alimentos em comunidades que já estavam contaminadas. Mas tais medidas são pontuais e não resolvem o problema, diz o MPF: todas as comunidades indígenas, independentemente do grau de insegurança alimentar, devem receber alimentos para evitar deslocamentos e a contaminação consequente.

“Não é crível que mesmo com recursos orçamentários disponibilizados para tanto e com dispensa de licitação para aquisição de itens para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do novo coronavírus (Lei 13.979/2020, art. 4º), as cestas básicas e materiais de higiene, que possuem caráter emergencial, não tenham chegado aos destinatários, por razões de ineficiência administrativa, diz a ação judicial iniciada em Santarém.

Nesse processo, o MPF pede que a Justiça Federal obrigue a Conab e a Funai a apresentarem, no prazo de cinco dias, a contar da decisão, cronograma para fornecimento de alimentos e itens de higiene, com datas específicas para entrega nas aldeias, em todas as aldeias indígenas atendidas pelas coordenações técnicas da Funai em Santarém, Oriximiná, baixo Tapajós e Trombetas de forma que, no máximo até 20 de junho, “utilizando-se todos os meios de transporte cabíveis, incluindo apoio logístico voluntário do Exército brasileiro” todas as comunidades recebam os alimentos. A Funai e a Conab devem manter a entrega de alimentos e materiais de higiene mensalmente para todos os povos, enquanto durar a pandemia do novo coronavírus.

O pedido feito à Justiça Federal em Belém é similar, podendo obrigar a Conab e a Funai a realizarem a entrega de 4.758 cestas básicas e kits de higiene às aldeias atendidas pela coordenação da fundação no baixo Tocantins – atendendo 13 diferentes povos em 18 terras indígenas e três áreas localizadas em projetos de assentamento. A mesma ação judicial pede a entrega de 3,5 mil cestas de alimentos e itens de higiene aos indígenas atendidos pela coordenação da Funai Sul Kayapó, na região de Redenção. A Funai e a Conab devem garantir que os alimentos sejam entregues mensalmente a todas as comunidades, enquanto durar a pandemia da covid-19.