Desigualdades regionais e o preconceito no Brasil

Por

Enildo Luiz Gouveia*

Em 10.10.2022

Neste artigo, a exemplo do que falo em sala de aula, busco pontuar as reais questões pelas quais existem, não apenas no Brasil, as desigualdades regionais. Diante de mais uma avalanche de falas e atitudes preconceituosas e sem base científica com relação a nós, nordestinos, em virtude do resultado do primeiro turno das eleições presidenciais deste ano, é lamentável que tenhamos que esclarecer o óbvio: a desigualdade regional tem raízes políticas e econômicas, e não biológicas ou naturais. Os condicionantes naturais até  influenciam, mas, de modo geral, são as ações políticas e econômicas que condicionam as desigualdades regionais, bem como, as podem superar.

Quando o Brasil começou efetivamente a se industrializar, a partir da década de 1930, logo de cara se privilegiou as regiões Sudeste e Sul (as primeiras siderúrgicas e indústrias automobilísticas, assim como a indústria do petróleo foram instaladas nessas regiões) do país, pois detinham à época, e hoje também, maior peso político, uma espécie de reserva de mão de obra “qualificada” e recursos financeiros oriundos do ciclo do café, já decadente. As demais regiões “(…) especialmente as do Centro-Oeste e Norte e Nordeste ficariam destinadas às atividades de menor valor agregado e com menor poder competitivo frente aos mercados nacional e internacional[1].

Quando, na década de 1950, se pensou em criar a Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste) como forma de reduzir as desigualdades regionais, o economista Celso Furtado, então coordenador do grupo precursor da Sudene (o GTDN) já alertava que, sem uma reforma agrária, nenhuma política de desenvolvimento seria efetiva no Nordeste. Bom, a Sudene já não existe mais e a profecia de Furtado se faz realidade. A Sudene padeceu por descontinuidades de projetos, interesses políticos, entre outras questões. Além disso, segundo Cano[2] escreve: “Em que pese o esforço de industrialização periférica realizado, as frustrações daqueles que imaginavam que essa desconcentração diminuiria sensivelmente os padrões de divergências econômica e social em termos da média nacional, aumentaram ainda mais nos anos 90, diante dos nefastos efeitos que as políticas neoliberais estão causando ao país e as suas regiões”. Outros autores/pesquisadores afirmam que todo esforço, especialmente durante a ditadura militar, para desenvolver as regiões mais “atrasadas” geraram ainda mais desigualdades regionais (com mais prioridade para o Sul e Sudeste) e intra-regionais.

Sabe-se, ou pelo menos deveríamos saber, que o motor do desenvolvimento é a Educação. Então, se não se investe em Educação, aprofunda-se a desigualdade social, econômica e regional. Políticas exclusivamente voltadas à indústria por si só não são capazes de tirar nenhuma região do atraso. O crescimento verificado no Brasil foi, e ainda é, concentrado. Apenas no período da primeira década dos anos 2000 se conseguiu minimamente reduzir as desigualdades regionais (sobre isto ver, por exemplo, o relatório de desenvolvimento humano publicado pela ONU em 2013), mas que durou pouco.

Existe intensa bibliografia sobre o tema disponível gratuitamente na internet. Ainda assim, é exaustivo tentar explicar história, ciência pra quem se nega a entender. Vemos no Brasil atual um culto à ignorância que se desdobra em preconceito, violência, negacionismo, etc. Em período eleitoral, é mais fácil acreditar no que me convém que na verdade. Enquanto isto, eu sigo tendo um orgulho danado de ser nordestino!

 

*Enildo Luiz Gouveia – Professor, Doutor em Geografia, poeta, cantor, compositor, teólogo é membro da Academia Cabense de Letras – ACL.

[1] NETO, Aristides Monteiro. Desigualdades regionais no Brasil: características e tendência recentes. Boletim regional, urbano e ambiental. Rio de Janeiro: IPEA, 2014.

[2] CANO, Wilson. Concentração e desconcentração econômica regional no Brasil: 1970/95. Revista Economia e Sociedade. Campinas: 1997